CPC na prática

A nova jurisprudência defensiva do STJ: A exigência da impugnação integral da decisão denegatória de recurso especial

A nova jurisprudência defensiva do STJ: A exigência da impugnação integral da decisão denegatória de recurso especial.

21/3/2019

Rogerio Mollica

O Código de Processo Civil tentou limitar a jurisprudência defensiva adotada pelos Tribunais Superiores para eliminar sumariamente recursos. Como tal prática é adotada para dar vazão ao excessivo número de recursos que são enviados aos Tribunais Superiores e não tendo sido adotado novo filtro eficaz, parecia óbvio que novas armadilhas seriam criadas.

Já tivemos oportunidade de analisar duas aqui nessa coluna, a comprovação prévia do feriado local e a exacerbação do princípio da dialeticidade.

Entretanto, no final de 2018 surgiu uma nova armadilha processual e que vem eliminando milhares de processos e surpreendeu toda a comunidade jurídica. O Superior Tribunal de Justiça passou a entender que em Agravo Denegatório, a parte deve recorrer de todos os fundamentos da inadmissão, mesmo que tal decisão possua capítulos autônomos.

De fato, é o que se depreende das seguintes decisões:

"A decisão que não admite o recurso especial tem como escopo exclusivo a apreciação dos pressupostos de admissibilidade recursal. Seu dispositivo é único, ainda quando a fundamentação permita concluir pela presença de uma ou de várias causas impeditivas do julgamento do mérito recursal, uma vez que registra, de forma unívoca, apenas a inadmissão do recurso. Não há, pois, capítulos autônomos nesta decisão. A decomposição do provimento judicial em unidades autônomas tem como parâmetro inafastável a sua parte dispositiva, e não a fundamentação como um elemento autônomo em si mesmo, ressoando inequívoco, portanto, que a decisão agravada é incindível e, assim, deve ser impugnada em sua integralidade, nos exatos termos das disposições legais e regimentais" (STJ-Corte Especial, ED no Ag em REsp 701.404, Min. Luis Felipe Salomão, j. 19.9.18, maioria, DJ 30.11.18). (g.n.)

"Falta de impugnação a todos os fundamentos da decisão recorrida. Manifesta inadmissibilidade. Desistência parcial. Impossibilidade. Não há como o agravante restringir o efeito devolutivo horizontal do agravo porque esse efeito já foi previamente delimitado pelos fundamentos da decisão exarada pelo Tribunal de origem. O ordenamento jurídico admite que a parte inconformada recorra, parcialmente, de uma decisão, e, ainda, que o órgão julgador conheça, em parte, do recurso interposto. Não há, entretanto, qualquer previsão que autorize a desistência parcial, tácita ou expressa, do recurso especial após sua interposição. É manifestamente inadmissível o agravo que não impugna, de maneira consistente, todos os fundamentos da decisão agravada" (STJ-3ª T., Ag em REsp 1.294.103-AgInt, Min. Nancy Andrighi, j. 11.9.18, DJ 18.9.18).

Obviamente que tal entendimento passou receber pesadas críticas de nossa Doutrina. Em sua recentíssima edição de 2019, o prestigiado Código de Processo Civil e legislação processual em vigor de Theotonio Negrão, José Roberto Gouvêa, Luis Guilherme A. Bondioli e João Francisco Naves da Fonseca discordou, com veemência, de tal recente entendimento nos seguintes termos:

"Com a devida vênia, esse entendimento não se sustenta. Se o recorrente podia na origem recorrer de apenas parte da decisão, nada o impede de reduzir as dimensões da sua pretensão recursal após sua formulação. No caso, era perfeitamente possível que o recorrente, por ocasião do agravo contra a decisão denegatória, desistisse de lutar pelo reconhecimento da violação da lei no trato da prescrição, inclusive por se convencer do acerto do pronunciamento judicial a seu respeito, e insistisse apenas na viabilidade dos demais temas trazidos no seu recurso especial, todos eles independentes e desvinculados da matéria prescricional. Infelizmente, a única explicação para o acórdão referido acima é a jurisprudência defensiva, que, paradoxalmente, fortaleceu-se após o advento da Lei 13.105, de 16.3.15, e não parece mais encontrar limites..." (g.n.) (50ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019, nota 2a ao art. 1.042 do CPC, p. 1.010).

Ora, se a decisão de inadmissão não possui capítulos autônomos, como explicar a possibilidade de um recurso só ser admitido parcialmente? Como explicar a existência dessas duas conhecidas Súmulas do Supremo Tribunal Federal:

Súmula 292 do STF: "Interposto o recurso extraordinário por mais de um dos fundamentos indicados no art. 101, III da Constituição, a admissão apenas por um deles não prejudica o seu conhecimento por qualquer dos outros".

Súmula 528 do STF: "Se a decisão contiver partes autônomas, a admissão parcial, pelo presidente do tribunal a quo, de recurso extraordinário que, sobre qualquer delas se manifestar, não limitará a apreciação de todas pelo Supremo Tribunal Federal, independentemente de interposição de agravo de instrumento".

Conforme se depreende, a súmula 528 do STF admite expressamente que a decisão de inadmissão pode conter partes autônomas, na verdade, os capítulos autônomos que restaram afastados recentemente pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça.

Cumpre reiterar que se os Tribunais possuem muitos recursos a serem julgados, que se criem filtros objetivos para selecionar os recursos que devem ser julgados e os que não. O que não se pode admitir é a criação de armadilhas não previstas em lei ou exacerbando a previsão legal e que surpreendem diuturnamente a advocacia e o jurisdicionado.

A Associação dos Advogados de São Paulo lançou uma ofensiva contra a a jurisprudência defensiva de nossos Tribunais Superiores junto com outras entidades da advocacia. Entretanto, enquanto não se consegue progresso na diminuição de tais armadilhas, cumpre aos operadores do Direito ficarem atentos a essas indesejáveis novidades e no caso ora analisado, atacar, de maneira consistente, todos os fundamentos da decisão agravada em seu Agravo Denegatório.

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André Pagani de Souza é doutor, mestre e especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Bacharel em Direito pela USP. Professor de Direito Processual Civil e coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da Universidade Presbiteriana Mackenzie em São Paulo. Pós-doutorando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Autor de diversos trabalhos na área jurídica. Membro do IBDP, IASP e CEAPRO. Advogado.

Daniel Penteado de Castro é mestre e doutor em Direito Processual pela Universidade de São Paulo. Especialista em Direito dos Contratos pelo Centro de Extensão Universitária. Membro fundador e conselheiro do CEAPRO – Centro de Estudos Avançados em Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP. Professor na pós-graduação Lato Sensu na Universidade Mackenzie, Escola Paulista de Direito e Escola Superior da Advocacia. Professor de Direito Processual Civil na graduação do Instituto de Direito Público. Advogado e Autor de livros jurídicos.

Elias Marques de M. Neto Pós-doutorados em Direito Processual Civil na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (2015), na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra/Ius Gentium Conimbrigae (2019), na Faculdade de Direito da Universidade de Salamanca (2022) e na Universitá degli Studi di Messina (2024/2025). Visiting Scholar no Instituto Max Planck, em Direito Processual Civil e em Direito Constitucional (2023/2024). Doutor (2014) e Mestre (2009) em Direito Processual Civil pela PUC/SP. MBA em Gestão Empresarial pela FGV (2012). Especialista em Direito da Economia e da Empresa pela FGV (2006). Especializações em Direito Processual Civil (2004) e em Direito dos Contratos (2005) pelo IICS/CEU. Especialização em Direito do Agronegócio pela FMP (2024). MBA em Agronegócio pela USP (2025). MBA em Energia pela PUC/PR (2025). Pós Graduação Executiva em Negociação (2013) e em Mediação (2015) na Harvard Law School. Pós Graduação Executiva em Business Compliance na University of Central Florida - UCF (2017). Pós Graduação Executiva em Mediação e Arbitragem Comercial Internacional pela American University / Washington College of Law (2018). Pós Graduação Executiva em U.S. Legal Practice and ADR pela Pepperdine University/Straus Institute for Dispute Resolution (2020). Curso de Extensão em Arbitragem (2016) e em Direito Societário (2017) pelo IICS/CEU. Bacharel em Direito pela USP (2001). Professor Doutor de Direito Processual Civil no Curso de Mestrado e Doutorado na Universidade de Marilia - Unimar (desde 2014), nos cursos de Especialização do CEU-Law (desde 2016) e na graduação da Facamp (desde 2021). Professor Colaborador na matéria de Direito Processual Civil em diversos cursos de Pós Graduação Lato Sensu e Atualização (ex.: EPD, Mackenzie, PUC/SP-Cogeae e USP-AASP). Advogado. Sócio de Resolução de Disputas do TozziniFreire Advogados (desde 2021). Atuou como Diretor Executivo Jurídico e Diretor Jurídico de empresas do Grupo Cosan (2009 a 2021). Foi associado sênior do Barbosa Mussnich e Aragão Advogados (2002/2009). Apontado pela revista análise executivos jurídicos como o executivo jurídico mais admirado do Brasil nas edições de 2018 e de 2020. Na mesma revista, apontado como um dos dez executivos jurídicos mais admirados do Brasil (2016/2019), e como um dos 20 mais admirados (2015/2017). Recebeu do CFOAB, em 2016, o Troféu Mérito da Advocacia Raymundo Faoro. Apontado como um dos 5 melhores gestores de contencioso da América Latina, em 2017, pela Latin American Corporate Counsel Association - Lacca. Listado em 2017 no The Legal 500's GC Powerlist Brazil. Recebeu, em 2019, da Associação Brasil Líderes, a Comenda de Excelência e Qualidade Brasil 2019, categoria Profissional do Ano/Destaque Nacional. Recebeu a medalha Mérito Acadêmico da ESA-OABSP (2021). Listado, desde 2021, como um dos advogados mais admirados do Brasil na Análise 500. Advogado recomendado para Resolução de Disputas, desde 2021, nos guias internacionais Legal 500, Latin Lawyer 250, Best Lawyers e Leaders League. Autor de livros e artigos no ramo do Direito Processual Civil. Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP, Pinheiros (desde 2013). Presidente da Comissão de Energia do IASP (desde 2013). Vice Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP (desde 2019). Membro fundador e Conselheiro (desde 2023) do Ceapro, tendo sido diretor nas gestões de 2013/2023. Conselheiro curador da célula de departamentos jurídicos do CRA/SP (desde 2016). Membro de comitês do Instituto Articule (desde 2018). Membro da lista de árbitros da Camarb e da Amcham. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), do CBar e da FALP. Membro honorário da ABEP. Foi presidente da Comissão de Defesa da Segurança Jurídica do Conselho Federal da OAB (2015/2016), Conselheiro do CORT/FIESP (2017), Coordenador do Núcleo de Direito Processual Civil da ESA-OAB/SP (2019/2021) e Secretário da comissão de Direito Processual Civil do CFOAB (2019/2021).

Rogerio Mollica é doutor e mestre em Direito Processual Civil pela USP. Especialista em Administração de Empresas CEAG-Fundação Getúlio Vargas/SP. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. Bacharel em Direito pela USP. Professor doutor nos cursos de mestrado e doutorado na Universidade de Marilia - Unimar. Advogado. Membro fundador, ex-conselheiro e ex-presidente do Ceapro - Centro de Estudos Avançados de Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT).