CPC na prática

Honorários sucumbenciais recursais e a recente decisão do STF

Honorários sucumbenciais recursais e a recente decisão do STF.

19/4/2018

André Pagani de Souza

A lei 13.105/2015 (CPC/2015) conferiu nova disciplina para a fixação dos honorários advocatícios sucumbenciais em seu art. 85 e seus dezenove parágrafos. No que diz respeito aos recursos, o § 11 do art. 85 dispõe que: "O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente, levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal (...)"1.

A novidade dos honorários advocatícios sucumbenciais fixados em grau de recurso reside no fato de ser obrigatória a majoração dos honorários advocatícios fixados anteriormente. Tanto isso é verdade que o § 3º do art. 20 da lei 5.925/1973 (CPC/1973) não impunha a majoração dos honorários advocatícios por parte do Tribunal quando do julgamento de um recurso, desde que observados os limites mínimo de 10% (dez por cento) e máximo de 20% (vinte por cento) do valor da condenação.

Diante disso, o que se pode considerar como inovação é que a majoração dos honorários passou ser um dever a cargo do Tribunal2, na hipótese de se negar provimento ou rejeitar recurso interposto de decisão que já havia fixado honorários advocatícios sucumbenciais a favor do recorrido em patamar inferior ao teto máximo de 20% (vinte por cento) do valor da condenação, limite esse que foi mantido pelo § 2º do art. 85 do CPC/20153.

Assim, caso o recurso seja rejeitado, é de rigor que ocorra a majoração dos honorários advocatícios sucumbenciais que, somados, não podem ultrapassar o teto de 20% (vinte por cento) do valor da condenação à luz do disposto nos §§ 1º e 2º do art. 85 do CPC/2015.

Sobre o tema, Rogério Mollica já se manifestou nesta coluna em 23/11/2017, no texto "Ainda sobre a sobre a sucumbência recursal vista pelos tribunais"4, no qual destacou que o Superior Tribunal de Justiça buscou uniformizar a interpretação do § 11 do art. 85 do CPC/2015 por meio de julgado assim ementado:

"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. ACÓRDÃO EMBARGADO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DO CPC/2015. FALTA DE SIMILITUDE FÁTICA. PRESCRIÇÃO. REPARAÇÃO. DIREITOS AUTORAIS. ILÍCITO EXTRACONTRATUAL. ACÓRDÃO EMBARGADO CONFORME A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. NÃO CABIMENTO. DECISÃO MANTIDA.

(...)

5. É devida a majoração da verba honorária sucumbencial, na forma do art. 85, § 11, do CPC/2015, quando estiverem presentes os seguintes requisitos, simultaneamente: a) decisão recorrida publicada a partir de 18.3.2016, quando entrou em vigor o novo Código de Processo Civil; b) recurso não conhecido integralmente ou desprovido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente; e c) condenação em honorários advocatícios desde a origem no feito em que interposto o recurso.

(STJ, AgInt nos EREsp 1539725/DF, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 09/08/2017, DJe 19/10/2017, grifos nossos)"

Questão importante diz respeito à hipótese de não terem sido fixados honorários advocatícios na decisão recorrida. Se isso não acontecer, não há que se falar em fixação de honorários em sede recursal, pois o § 11 do art. 85 trata da majoração de honorários e não da fixação ou arbitramento de honorários em sede recursal. Ou seja, só é possível majorar algo que já existe. Portanto, se não existem honorários fixados na decisão recorrida, em sede recursal não faz o menor sentido falar em majorar.

O raciocínio acima exposto é o que foi consagrado pelo Superior Tribunal de Justiça no recurso cuja ementa está acima transcrita. Em outras palavras, deve haver "condenação em honorários advocatícios desde a origem no feito em que foi interposto o recurso" para se aplicar o § 11 do art. 85 do CPC/2015.

O mesmo raciocínio foi empregado em recente julgado, agora do Supremo Tribunal Federal. Confira-se:

"AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NO PROCESSO DO TRABALHO. ART. 791-A DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO, INTRODUZIDO PELA LEI 13.467/2017. INAPLICABILIDADE A PROCESSO JÁ SENTENCIADO.

1. A parte vencedora pede a fixação de honorários advocatícios na causa com base em direito superveniente – a lei 13.467/2017, que promoveu a cognominada “Reforma Trabalhista".

2. O direito aos honorários advocatícios sucumbenciais surge no instante da prolação da sentença. Se tal crédito não era previsto no ordenamento jurídico nesse momento processual, não cabe sua estipulação com base em lei posterior, sob pena de ofensa ao princípio da irretroatividade da lei.

3. Agravo interno a que se nega provimento.

(STF, 1ª Turma, ARE 1014675 AGR / MG, rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 23.03.2018, negaram provimento, v.u.)

O que mais importa para o tema em questão, entretanto, não está na ementa acima transcrita, mas sim no corpo do julgado. É que, no caso concreto, o recorrente pedia, em sede recursal, o arbitramento de honorários de sucumbência recursal com base no § 11 do art. 85 do CPC/2015. Porém, o art. 791-A, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), introduzido pela Lei n. 13.467/2017 ("Reforma Trabalhista"), que estabelece os honorários de sucumbência nas reclamações trabalhistas, não estava em vigor na época em que foi proferida a decisão recorrida e portanto não foram fixados na origem. Assim, decidiu o Supremo Tribunal de Federal – em harmonia com o que já havia decidido o Superior Tribunal de Justiça – que não é possível fixar honorários sucumbenciais recursais se não houve arbitramento de honorários de sucumbência na decisão recorrida.

O entendimento acima exposto pode ser extraído do seguinte trecho do acórdão acima mencionado da lavra do Min. Alexandre de Moraes:

"(...) A ora agravante postula a aplicação da norma neste caso, de modo que a parte adversa seja condenada a lhe pagar honorários de advogado.

Sem razão, contudo. O direito aos honorários advocatícios sucumbenciais surge no instante da prolação da sentença. Se tal crédito não era previsto no ordenamento jurídico nesse momento processual, não cabe sua estipulação com base em lei posterior, sob pena de ofensa ao princípio da irretroatividade da lei.

Tampouco cabe aplicação subsidiária do Código de Processo Civil de 2015, no tocante ao arbitramento dessa verba em fase recursal, na medida em que tal prática pressupõe previsão de honorários na origem, o que não se verifica no caso" (destacamos).

Em suma, o Supremo Tribunal Federal veio confirmar, mais uma vez, aquilo que já havia decidido o Superior Tribunal de Justiça: o art. 85, § 11, do CPC/2015, somente pode ser invocado para majorar honorários advocatícios em sede recursal se eles foram arbitrados na origem.

__________

1 Daniel Penteado de Castro já tratou do tema nesta coluna em 24/8/2017, ao escrever sobre a visão dos tribunais acerca dos honorários advocatícios em grau recursal, conforme acesso em 17/4/2018.

2 Nesse sentido, Cassio Scarpinella Bueno expõe que "é pertinente também questionar se a majoração é um dever a cargo do Tribunal. A resposta mais adequada parece ser positiva, observados, à falta de autorização expressa em sentido contrário, os limites do § § 2º e 3º do art. 85" (Novo Código de Processo Civil Anotado, 3ª edição, São Paulo, Saraiva, 2017, p. 149).

3 Vale notar, como ensina José Miguel Garcia Medina, que, se for dado provimento ao recurso para reformar a decisão recorrida, haverá a inversão dos honorários advocatícios sucumbenciais e não a majoração: “Havendo reforma da sentença em grau de recurso, inverte-se o ônus da sucumbência (...). Caso o recurso seja rejeitado, dispõe o art. 85, § 11, do CPC/2015, que o tribunal majorará os honorários fixados anteriormente. Consideramos correta a opção do CPC/2015, já que a sentença, ao fixar honorários, terá considerado o trabalho realizado até então, não tendo o juiz da causa como antever se haverá ou não recurso, e qual será o trabalho realizado nesta fase” (Novo código de processo civil comentado, 4ª edição, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2016, p. 186).

4 Ainda sobre a sucumbência recursal vista pelos tribunais. (Acesso em 17/4/2018).

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André Pagani de Souza é doutor, mestre e especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Bacharel em Direito pela USP. Professor de Direito Processual Civil e coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da Universidade Presbiteriana Mackenzie em São Paulo. Pós-doutorando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Autor de diversos trabalhos na área jurídica. Membro do IBDP, IASP e CEAPRO. Advogado.

Daniel Penteado de Castro é mestre e doutor em Direito Processual pela Universidade de São Paulo. Especialista em Direito dos Contratos pelo Centro de Extensão Universitária. Membro fundador e conselheiro do CEAPRO – Centro de Estudos Avançados em Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP. Professor na pós-graduação Lato Sensu na Universidade Mackenzie, Escola Paulista de Direito e Escola Superior da Advocacia. Professor de Direito Processual Civil na graduação do Instituto de Direito Público. Advogado e Autor de livros jurídicos.

Elias Marques de M. Neto tem pós-doutorado em Direito Processual Civil na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (2015). Pós Doutorado em Democracia e Direitos Humanos, com foco em Direito Processual Civil, na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra/Ius Gentium Conimbrigae (2019). Pós Doutorado em Direitos Sociais, com foco em Direito Processual Civil, na Faculdade de Direito da Universidade de Salamanca (2022). Pesquisador visitante no Instituto Max Planck, em Direito Processual Civil (2023). Doutor (2014) e Mestre (2009) em Direito Processual Civil pela PUC/SP. MBA em Gestão Empresarial pela FGV (2012). Especialista em Direito da Economia e da Empresa pela FGV (2006). Especializações em Direito Processual Civil (2004) e em Direito dos Contratos (2005) pelo IICS/CEU. Especialização em Direito do Agronegócio pela FMP (2024). Pós Graduação Executiva nos Programas de Negociação (2013) e de Mediação (2015) da Harvard Law School. Pós Graduação Executiva em Business Compliance na University of Central Florida - UCF (2017). Pós Graduação Executiva em Mediação e Arbitragem Comercial Internacional pela American University / Washington College of Law (2018). Pós Graduação Executiva em U.S. Legal Practice and ADR pela Pepperdine University/Straus Institute for Dispute Resolution (2020). Curso de Extensão em Arbitragem (2016) e em Direito Societário (2017) pelo IICS/CEU. Bacharel em Direito pela USP (2001). Professor Doutor de Direito Processual Civil no Curso de Mestrado e Doutorado na Universidade de Marilia - Unimar (desde 2014), nos cursos de Especialização do CEU-Law (desde 2016) e na graduação da Facamp (desde 2021). Professor Colaborador na matéria de Direito Processual Civil em cursos de Pós Graduação Lato Sensu e Atualização (destacando-se a EPD, Mackenzie, PUC/SP-Cogeae, UCDB, e USP-AASP). Advogado. Sócio de Resolução de Disputas do TozziniFreire Advogados (desde 2021). Atuou como Diretor Executivo Jurídico e Diretor Jurídico de empresas do Grupo Cosan (2009 a 2021). Foi associado sênior do Barbosa Mussnich e Aragão Advogados (2002/2009). Apontado pela revista análise executivos jurídicos como o executivo jurídico mais admirado do Brasil nas edições de 2018 e de 2020. Na mesma revista, apontado como um dos dez executivos jurídicos mais admirados do Brasil (2016/2019), e como um dos 20 mais admirados (2015/2017). Recebeu do CFOAB, em 2016, o Troféu Mérito da Advocacia Raymundo Faoro. Apontado como um dos 5 melhores gestores de contencioso da América Latina, em 2017, pela Latin American Corporate Counsel Association - Lacca. Listado em 2017 no The Legal 500's GC Powerlist Brazil: Teams. Recebeu, em 2019, da Associação Brasil Líderes, a Comenda de Excelência e Qualidade Brasil 2019, categoria Profissional do Ano/Destaque Nacional. Recebeu a medalha Mérito Acadêmico da ESA-OABSP (2021). Listado, desde 2021, como um dos advogados mais admirados do Brasil na Análise 500. Advogado recomendado para Resolução de Disputas, desde 2021, nos guias internacionais Legal 500, Latin Lawyer 250, Best Lawyers e Leaders League. Autor de livros e artigos no ramo do Direito Processual Civil. Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP, Pinheiros (desde 2013). Presidente da Comissão de Energia do IASP (desde 2013). Vice Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP (desde 2019). Membro fundador e Conselheiro (desde 2023) do Ceapro, tendo sido diretor nas gestões de 2013/2023. Conselheiro curador da célula de departamentos jurídicos do CRA/SP (desde 2016). Membro de comitês do Instituto Articule (desde 2018). Membro da lista de árbitros da Camarb. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), do CBar e da FALP. Foi presidente da Comissão de Defesa da Segurança Jurídica do Conselho Federal da OAB (2015/2016), Conselheiro do CORT/FIESP (2017), Coordenador do Núcleo de Direito Processual Civil da ESA-OAB/SP (2019/2021) e Secretário da comissão de Direito Processual Civil do CFOAB (2019/2021).

Rogerio Mollica é doutor e mestre em Direito Processual Civil pela USP. Especialista em Administração de Empresas CEAG-Fundação Getúlio Vargas/SP. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. Bacharel em Direito pela USP. Professor doutor nos cursos de mestrado e doutorado na Universidade de Marilia - Unimar. Advogado. Membro fundador, ex-conselheiro e ex-presidente do Ceapro - Centro de Estudos Avançados de Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT).