CPC na prática

Ainda sobre a sucumbência recursal vista pelos tribunais

Ainda sobre a sucumbência recursal vista pelos tribunais.

23/11/2017

Rogerio Mollica

Em meu último artigo publicado nesta coluna1, tive a oportunidade de analisar algumas questões controvertidas sobre a sucumbência recursal, que é uma das esperanças do novo Código para que tenhamos uma diminuição dos recursos meramente protelatórios, a fim de se obter a tão almejada celeridade processual.

Por ser um instituto novo, o Judiciário vem suprindo várias lacunas da lei e esclarecendo pontos controvertidos sobre a condenação em honorários no grau recursal. Parece claro, que seria melhor que a lei não ensejasse essas controvérsias, já que cabe ao legislador fazer a lei e ao Judiciário aplicá-la. Entretanto, tendo em vista as dificuldades do dia a dia forense e o moroso processo legislativo, diuturnamente o Judiciário vem sendo instado a decidir sobre a aplicação do novo CPC.

Nesse sentido, veja-se a recentíssima decisão do Superior Tribunal de Justiça2, que admitiu a interposição de agravo de instrumento em face de decisões sobre competência, sendo que tal matéria não se encontra no rol das previsões do artigo 1.015 do novo Código3.

Com a sucumbência recursal não vem sendo diferente. Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Agravo Interno nos Embargos de Divergência 1.539.725/DF (relator ministro Antônio Carlos Ferreira, 2ª seção, in DJe de 19/10/2017) fixou seguintes orientações a respeito dos honorários recursais disciplinados no novo CPC:

"(...) 5 - É devida a majoração da verba honorária sucumbencial, na forma do art. 85, § 11, do CPC/2015, quando estiverem presentes os seguintes requisitos, simultaneamente:

a) decisão recorrida publicada a partir de 18.3.2016, quando entrou em vigor o novo CPC;

b) recurso não conhecido integralmente ou desprovido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente; e

c) condenação em honorários advocatícios desde a origem, no feito em que interposto o recurso;

6. Não haverá honorários recursais no julgamento de agravo interno e de embargos de declaração apresentados pela parte que, na decisão que não conheceu integralmente de seu recurso ou negou-lhe provimento, teve imposta contra si a majoração prevista no parágrafo 11 do artigo 85 do CPC/2015;

7. Com a interposição de embargos de divergência em recurso especial tem início novo grau recursal, sujeitando-se o embargante, ao questionar decisão publicada na vigência do CPC/2015, à majoração dos honorários sucumbenciais, na forma do parágrafo 11 do artigo 85, quando indeferidos liminarmente pelo relator ou se o colegiado deles não conhecer ou negar-lhes provimento;

8. Quando for devida a verba honorária recursal, mas, por omissão, o relator deixar de aplicá-la em decisão monocrática, poderá o colegiado, ao não conhecer ou desprover o respectivo agravo interno, arbitrá-la ex officio, por se tratar de matéria de ordem pública, que independe de provocação da parte, não se verificando reformatio in pejus;

9. Da majoração dos honorários sucumbenciais promovida com base no parágrafo 11 do artigo 85 do CPC/2015 não poderá resultar extrapolação dos limites previstos nos parágrafos 2º e 3º do referido artigo;

10. É dispensada a configuração do trabalho adicional do advogado para a majoração dos honorários na instância recursal, que será considerado, no entanto, para quantificação de tal verba." (g.n.)

Como se pode verificar, a decisão é na verdade um verdadeiro manual quanto a aplicação da sucumbência recursal. Dentre os diversos pontos, parece interessante destacar três e que se referem aos grifos na decisão.

O julgado do Superior Tribunal de Justiça prevê, de forma acertada, que só teremos sucumbência recursal no caso do recurso não ser conhecido ou improvido. Portanto, no caso de provimento do recurso, teríamos somente a inversão dos honorários, sem a majoração recursal4. Tal entendimento é contrário ao Enunciado nº 243 do Fórum Permanente de Processualistas Civis que prevê: "No caso de provimento do recurso de apelação, o tribunal redistribuirá os honorários fixados em primeiro grau e arbitrará os honorários de sucumbência recursal."

Outro ponto a ser destacado é a possibilidade de se fixar honorários recursais em Agravos Internos, nos casos em que a decisão monocrática não os fixar. Por exemplo, no caso de improvimento de Recurso Especial, de forma monocrática, e sem a fixação de honorários recursais, pode a Turma os fixar no julgamento do Agravo Interno do Recorrente. Se a decisão monocrática já os tiver fixado, não poderão ser majorados via agravo interno.

Cumpre ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça albergou o entendimento de que a fixação dos honorários recursais pode e deve ser feita pelo Tribunal, independentemente de pedido expresso das partes, eis que o dispositivo é imperativo ao prever que "O tribunal, ao julgar o recurso, majorará os honorários fixados anteriormente (...)"5

Outro ponto bastante controvertido é o teto dos honorários fixados em todo o processo de conhecimento no montante de 20%. Fixados os honorários advocatícios, por equidade (§ 8º), em percentual superior aos 20%, mesmo assim seria cabível a fixação de honorários recursais?

Os tribunais, em boa hora, vêm decidindo que sim, até para se evitar honorários irrisórios e aviltantes. Neste sentido é o entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo:

"TRIBUTÁRIO – APELAÇÃO – EXECUÇÃO FISCAL – IPTU – EXERCÍCIO DE 2004 E 2005 – MUNICÍPIO DE BERTIOGA – Sentença que reconheceu a ilegitimidade passiva do executado e julgou extinta a execução fiscal. Apelo do exequente. ILEGITIMIDADE PASSIVA – OCORRÊNCIA – Transferência do imóvel em data anterior à propositura da execução - Impossibilidade de alteração do polo passivo no curso da demanda - Se a transferência do bem, devidamente registrada, ocorreu antes da propositura da execução, a troca do sujeito passivo não é viável – Inteligência da Súmula 392 do Superior Tribunal de Justiça – Precedentes do STJ e desta C. Câmara. Honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da causa (R$ 2.185,00) – Verba honorária que corresponde a aproximadamente R$ 219,00 - HONORÁRIOS RECURSAIS - Artigo 85, §11 do Código de Processo Civil de 2015 - MAJORAÇÃO - POSSIBILIDADE - Ocorre que o Código de Processo Civil não é a única norma a ser aplicada - Aplicação conjunta com a Lei Federal nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) - Entendimento jurisprudencial no sentido de não permitir o aviltamento da profissão de advogado - Honorários que devem ser fixados de forma razoável, respeitando a dignidade da advocacia - Honorários recursais fixados em R$ 2.781,00 que atende aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade - Verba honorária que totaliza R$ 3.000,00. Sentença mantida – Recurso desprovido."

(TJSP; Apelação 0532584-28.2006.8.26.0075; Relator (a): Eurípedes Faim; Órgão Julgador: 15ª Câmara de Direito Público; Foro de Bertioga - SETOR DE EXECUÇÕES FISCAIS; Data do Julgamento: 17/11/2017; Data de Registro: 17/11/2017)

Por fim, existem julgados que aplicam a sucumbência recursal, entretanto, determinam que o juízo da fase de liquidação é que deve fixar a majoração, segundo se depreende do seguinte julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo:

SERVIDOR PÚBLICO. POLICIAL MILITAR. PARCIAL procedÊNCIA Do pedido mediato. SERVIDOR PÚBLICO. Policial Militar. Pretensão de reconhecimento de vínculo empregatício. Contratação de voluntários nos termos da Lei Federal n. 10.029/2000 e da Lei Estadual n. 11.064/2002. Atos normativos declarados inconstitucionais pelo Órgão Especial desta Corte. Contratação que viola a obrigatoriedade do concurso para o acesso aos cargos públicos. Tese n. 2 firmada no julgamento do IRDR n. 0038758-92.2016.8.26.0000. Reconhecimento do vínculo apenas para o fim de autorizar o pagamento das verbas remuneratórias, excluídas aquelas destinadas aos servidores providos em cargos efetivos, e para contagem de tempo para fins previdenciários. Dever de remuneração. Contribuição previdenciária. Recolhimento. Possibilidade. Desconto a partir da dívida apurada. Serviço efetivamente prestado. CRITÉRIO DE INCIDÊNCIA DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS. Incidência de correção monetária e juros de mora de acordo com o artigo 1º-F, da Lei 9.494/97, com a redação dada pela lei n. 11.960/2009. Reconhecimento da inconstitucionalidade do artigo 5º da Lei n. 11.960/09. Entendimento aplicável apenas à correção monetária devida nos casos de precatório já expedido. Inexistência de manifestação expressa sobre a correção monetária devida nas condenações da Fazenda Pública. Precedentes do STF. Juros de mora. Citação. Correção monetária. Desde a data em que deveria ter sido feito o pagamento. Observância dos índices de remuneração básica da caderneta de poupança. HONORÁRIOS RECURSAIS. A parte que sucumbiu no julgamento do recurso deverá arcar com o pagamento de honorários advocatícios devidos no segundo grau de jurisdição. Aplicação da regra do artigo 85, § 11, da Lei n. 13.105/2015 (Código de Processo Civil). Majoração delegada para o juízo da fase de liquidação, nos termos dos §§ 2º e 3º do artigo 85 do CPC. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO DA AUTORA. PROVIDO EM PARTE O RECURSO DA RÉ E ACOLHIDA EM PARTE A REMESSA NECESSÁRIA. (g.n.)

(TJSP; Apelação / Reexame Necessário 1025525-79.2015.8.26.0506; Relator (a): José Maria Câmara Junior; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Público; Foro de Ribeirão Preto - 1ª Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 01/09/2017; Data de Registro: 01/09/2017)

Por mais que a sentença seja ilíquida e a condenação em face da Fazenda Pública seja escalonada segundo faixas, parece ser mais conveniente que o Tribunal fixe desde logo o aumento dos honorários em face da sucumbência recursal, eis que ao deixar essa discussão para a fase de liquidação fatalmente teremos a reabertura da questão e a interposição de agravos em relação a referida fixação.

__________

1 Publicação em 5/10/2017.

2 REsp 1.679.909 4ª Turma do STJ.

3 Em artigo publicado em 20/4/2017 nessa coluna, o professor Elias Marques de Medeiros Neto já apontava a existência de vários julgados de Tribunais locais nesse sentido.

4 Esse também é o entendimento de Luiz Dellore (Teoria Geral do Processo: Comentários ao CPC de 2015, São Paulo: Forense, 2015, p. 299), Bruno Vasconcelos Carrilho Lopes (Comentários ao Código de Processo Civil, v. II, São Paulo, Saraiva, 2017, p. 171) e Ronaldo Cramer (Comentários ao Código de Processo Civil, Coordenador Cássio Scarpinella Bueno, vol, 1, São Paulo: Saraiva, 2017, p. 448). Em sentido contrário Luiz Henrique Volpe Camargo (Breves Comentários ao Código de Processo Civil, Teresa Arruda Alvim Wambier et al. São Paulo: RT, 2015, p. 323/325.

5 Nesse mesmo sentido é o entendimento de Daniel Amorim Assumpção Neves: "Entendo que a previsão legal faz com que a readequação do valor dos honorários advocatícios passe a fazer parte da profundidade do efeito devolutivo dos recursos, de forma que mesmo não havendo qualquer pedido das partes quanto a essa matéria o tribunal poderá analisa-la para readequar os honorários conforme o trabalho desempenhado em grau recursal." (Novo Código de Processo Civil Comentado, salvador: JusPodivm, 2016, p. 137).

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André Pagani de Souza é doutor, mestre e especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Bacharel em Direito pela USP. Professor de Direito Processual Civil e coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da Universidade Presbiteriana Mackenzie em São Paulo. Pós-doutorando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Autor de diversos trabalhos na área jurídica. Membro do IBDP, IASP e CEAPRO. Advogado.

Daniel Penteado de Castro é mestre e doutor em Direito Processual pela Universidade de São Paulo. Especialista em Direito dos Contratos pelo Centro de Extensão Universitária. Membro fundador e conselheiro do CEAPRO – Centro de Estudos Avançados em Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP. Professor na pós-graduação Lato Sensu na Universidade Mackenzie, Escola Paulista de Direito e Escola Superior da Advocacia. Professor de Direito Processual Civil na graduação do Instituto de Direito Público. Advogado e Autor de livros jurídicos.

Elias Marques de M. Neto Pós-doutorados em Direito Processual Civil na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (2015), na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra/Ius Gentium Conimbrigae (2019), na Faculdade de Direito da Universidade de Salamanca (2022) e na Universitá degli Studi di Messina (2024/2025). Visiting Scholar no Instituto Max Planck, em Direito Processual Civil e em Direito Constitucional (2023/2024). Doutor (2014) e Mestre (2009) em Direito Processual Civil pela PUC/SP. MBA em Gestão Empresarial pela FGV (2012). Especialista em Direito da Economia e da Empresa pela FGV (2006). Especializações em Direito Processual Civil (2004) e em Direito dos Contratos (2005) pelo IICS/CEU. Especialização em Direito do Agronegócio pela FMP (2024). MBA em Agronegócio pela USP (2025). MBA em Energia pela PUC/PR (2025). Pós Graduação Executiva em Negociação (2013) e em Mediação (2015) na Harvard Law School. Pós Graduação Executiva em Business Compliance na University of Central Florida - UCF (2017). Pós Graduação Executiva em Mediação e Arbitragem Comercial Internacional pela American University / Washington College of Law (2018). Pós Graduação Executiva em U.S. Legal Practice and ADR pela Pepperdine University/Straus Institute for Dispute Resolution (2020). Curso de Extensão em Arbitragem (2016) e em Direito Societário (2017) pelo IICS/CEU. Bacharel em Direito pela USP (2001). Professor Doutor de Direito Processual Civil no Curso de Mestrado e Doutorado na Universidade de Marilia - Unimar (desde 2014), nos cursos de Especialização do CEU-Law (desde 2016) e na graduação da Facamp (desde 2021). Professor Colaborador na matéria de Direito Processual Civil em diversos cursos de Pós Graduação Lato Sensu e Atualização (ex.: EPD, Mackenzie, PUC/SP-Cogeae e USP-AASP). Advogado. Sócio de Resolução de Disputas do TozziniFreire Advogados (desde 2021). Atuou como Diretor Executivo Jurídico e Diretor Jurídico de empresas do Grupo Cosan (2009 a 2021). Foi associado sênior do Barbosa Mussnich e Aragão Advogados (2002/2009). Apontado pela revista análise executivos jurídicos como o executivo jurídico mais admirado do Brasil nas edições de 2018 e de 2020. Na mesma revista, apontado como um dos dez executivos jurídicos mais admirados do Brasil (2016/2019), e como um dos 20 mais admirados (2015/2017). Recebeu do CFOAB, em 2016, o Troféu Mérito da Advocacia Raymundo Faoro. Apontado como um dos 5 melhores gestores de contencioso da América Latina, em 2017, pela Latin American Corporate Counsel Association - Lacca. Listado em 2017 no The Legal 500's GC Powerlist Brazil. Recebeu, em 2019, da Associação Brasil Líderes, a Comenda de Excelência e Qualidade Brasil 2019, categoria Profissional do Ano/Destaque Nacional. Recebeu a medalha Mérito Acadêmico da ESA-OABSP (2021). Listado, desde 2021, como um dos advogados mais admirados do Brasil na Análise 500. Advogado recomendado para Resolução de Disputas, desde 2021, nos guias internacionais Legal 500, Latin Lawyer 250, Best Lawyers e Leaders League. Autor de livros e artigos no ramo do Direito Processual Civil. Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP, Pinheiros (desde 2013). Presidente da Comissão de Energia do IASP (desde 2013). Vice Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP (desde 2019). Membro fundador e Conselheiro (desde 2023) do Ceapro, tendo sido diretor nas gestões de 2013/2023. Conselheiro curador da célula de departamentos jurídicos do CRA/SP (desde 2016). Membro de comitês do Instituto Articule (desde 2018). Membro da lista de árbitros da Camarb e da Amcham. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), do CBar e da FALP. Membro honorário da ABEP. Foi presidente da Comissão de Defesa da Segurança Jurídica do Conselho Federal da OAB (2015/2016), Conselheiro do CORT/FIESP (2017), Coordenador do Núcleo de Direito Processual Civil da ESA-OAB/SP (2019/2021) e Secretário da comissão de Direito Processual Civil do CFOAB (2019/2021).

Rogerio Mollica é doutor e mestre em Direito Processual Civil pela USP. Especialista em Administração de Empresas CEAG-Fundação Getúlio Vargas/SP. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. Bacharel em Direito pela USP. Professor doutor nos cursos de mestrado e doutorado na Universidade de Marilia - Unimar. Advogado. Membro fundador, ex-conselheiro e ex-presidente do Ceapro - Centro de Estudos Avançados de Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT).