CPC na prática

Fim da ação de exibição de documentos?

Fim da ação de exibição de documentos?

9/11/2017

Daniel Penteado de Castro

Dúvidas não há de que as medidas cautelares típicas disciplinadas no CPC/73 foram extintas, a incluir-se a então chamada "medida cautelar de exibição", a qual se ocupavam os arts. 844 e 845 do código anterior, utilizados como fundamento de medida cautelar de exibição de documento ou coisa.

Diante da supressão de uma medida cautelar típica de comum serventia na praxe forense, resta saber, no perfil do CPC/2015, qual o nome iuris empregado para a obtenção de tutela jurisdicional destinada a compelir o réu a exibição de dado documento ou coisa. Os julgados ligados a ações propostas na vigência do CPC/2015 apresentam uma variedade de entendimentos.

Nesse contexto, já se decidiu que não caberia a formulação de pedido de exibição de documento na forma de tutela provisória (satisfativa ou cautelar em caráter antecedente), a carecer interesse de agir para medida que em verdade se adequa melhor à ação autônoma de produção antecipada da prova disciplina nos artigos. 382 e seguintes:

"EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. REQUISITOS. 1. No âmbito do novo Código de Processo Civil, o pedido de exibição de documentos, formulado de forma autônoma, antecedente e satisfativa, deve ser realizado por meio de produção antecipada de provas. 2. Cabe à parte, então, cumprir os requisitos do art. 382 do CPC, apresentando as razões que justifiquem a necessidade da antecipação e mencionando com precisão os fatos sobre os quais a prova há de recair. Recurso não provido."

(TJSP, Apelação n. 1002136-54.2017.8.26.0196, 14ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Melo Colombi, j. 06.06.2017, v.u., grifou-se)

Em outra oportunidade, a Corte bandeirante entendeu que uma ação autônoma, pelo procedimento comum, em verdade revela o mesmo desiderato da medida cautelar de exibição de documentos antes prevista no CPC/73 e, de igual modo, tal ação é despida de interesse de agir na modalidade adequação:

"AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER -EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO – Sentença que julgou procedente a ação – Pretensão da ré de reforma da r. sentença. ADMISSIBILIDADE: Em que pese a autora ter dado à ação o nome de obrigação de fazer, verifica-se dos autos que na realidade trata-se de ação cautelar de exibição de documento. A ação proposta é inadequada e não mais prevista em lei, inexistindo, portanto, os pressupostos processuais para o seu prosseguimento válido, previstos no art. 485, VI do novo CPC. Sentença reformada. RECURSO PROVIDO."

(TJSP, Apelação n. 1041857-60.2016.8.26.0224, 37ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Israel Góes dos Anjos, j. 7.11.2017, v.u., grifou-se)

Noutro giro entendeu-se que não há espaço sequer para a ação autônoma de produção antecipada da prova, mas sim, eventual pedido de exibição de documento deve se materializar pela via incidental, nos termos dos artigos 396 e seguintes do CPC:

"APELAÇÃO AÇÃO CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO NOMINADA COMO PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVAS FALTA DE INTERESSE DE AGIR AUSÊNCIA DE NECESSIDADE DO AJUIZAMENTO DA PRESENTE AÇÃO. Com o advento do Novo Código de Processo Civil, não há mais previsão de ação cujo objeto seja a exibição de documentos. PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Considerando que a presente demanda foi proposta já sob a égide do Novo Código de Processo Civil, forçoso o reconhecimento de que a apelante não preenche o binômio NECESSIDADE/UTILIDADE caracterizador de seu interesse de agir. SENTENÇA MANTIDA RECURSO IMPROVIDO.

(...) Por primeiro, importante salientar que, muito embora a presente ação tenha sido nomeada como produção antecipada de provas, trata-se, na verdade, da ação cautelar de exibição de documento do Código de Processo Civil de 1973. Assim, a presente ação efetivamente deveria ter sido extinta por falta de interesse de agir decorrente do fato de que não existe, no ordenamento atual, ação cautelar de exibição de documentos.

Com efeito, a partir do advento do Novo Código de Processo Civil, não existe mais ação cautelar satisfativa e, assim sendo, em havendo necessidade de exibição de documentos, tal medida deve ser buscada incidentalmente.

De fato, "(...) houve a unificação do procedimento, não existindo mais previsão de um processo destinado apenas a satisfazer a tutela cautelar de exibição de documento, passando tal medida a integrar a própria ação principal. Assim, o pedido de exibição deverá ser deduzido de forma incidente no feito, observando-se o disposto nos artigos 396 e seguintes do CPC (...)” (TJSP; Apelação nº 1010223-33.2016.8.26.0196; 32ª Câmara de Direito Privado; Rel. Des. KIOITSI CHICUTA; J. 15/09/2016).

No mesmo sentido: TJSP; Apelação nº 1010397- 94.2016.8.26.0405; 19ª Câmara de Direito Privado; Rel. Des. RICARDO PESSOA DE MELLO BELLI; J. 26/09/2016.

Destarte, considerando que a presente demanda foi proposta já sob a égide do Novo Código de Processo Civil, é forçoso o reconhecimento de que a apelante é carecedora de ação, por ausência de necessidade de propor a presente demanda, já que sua pretensão pode ser deduzida em caráter incidental na futura ação declaratória. Assim, de rigor a extinção do feito sem julgamento de mérito.

Dizer mais, seria acrescer folhas...

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso."

(TJSP, Apelação n. 1057219-86.2016.8.26.0100, 38ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Eduardo Siqueira, j. 29.07.2017, v.u., grifou-se)

Houve precedente adotando corrente diversa, para se permitir tutela jurisdicional específica formulada por meio de ação autônoma sujeita ao procedimento comum e voltada a condenação de exibição de determinado documento:

"AÇÃO COM PEDIDO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS Pretensão do autor de que seja anulada a respeitável sentença que extinguiu o processo, sem exame do mérito Cabimento Hipótese em que o autor pretende obter judicialmente documento relativo à relação jurídica estabelecida entre as partes, com o intuito de verificar a regularidade dos termos nele constantes Via processual escolhida pelo autor que se mostra adequada para a obtenção do provimento jurisdicional por ele postulado, o qual é necessário para os fins pretendidos Autor que tem o direito de pedir a exibição dos documentos comuns, dos quais necessita para possível defesa de seus direitos em juízo Sentença anulada Ação julgada procedente (CPC, art. 1.013, §3º) - RECURSO PROVIDO."

(TJSP, Apelação n. 1026841-08.2016.8.26.0405, 13ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Ana de Lourdes Coutinho Silva da Fonseca, j. 8.11.2017, v.u., grifou-se)

E em julgado prolatado quando do fechamento deste artigo, entendeu-se pelo descabimento de ação autônoma de exibição de documento, a admitir-se, todavia, semelhante tutela jurisdicional por meio da ação autônoma de produção antecipada da prova (artigos 381 e 382 do CPC/2015), ou, ainda, a formulação de idêntica providência por meio da exibição incidental no curso de ação autônoma (artigos 396 a 404 do CPC/2015):

"INTERESSE DE AGIR Ação ajuizada para exibição de documentos Inadmissibilidade, uma vez que há procedimento específico para obtenção de documentos cujo conhecimento pode viabilizar solução extrajudicial ou ajuizamento de ação principal Inteligência dos incisos II e III do art. 381 do Cód. de Proc. Civil Sentença mantida - Apelação improvida.

(...)

Com efeito, além de o atual Cód. de Proc. Civil não prever nenhuma cautelar específica, exige-se para o ajuizamento de tutela cautelar antecedente a presença de "perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo" (art. 305 do Cód. de Proc. Civil), o que não se vislumbra na exibição de documento.

Mais ainda, o Cód. de Proc. Civil disciplinou a exibição de documentos em dois institutos distintos: produção antecipada de provas (art. 381 e seguintes) e exibição incidental (art. 396 e seguintes) cuja disciplina é análoga àquela do Cód. de Proc. Civil anterior.

Já a primeira hipótese consiste em inovação do atual Cód. De Proc. Civil que, em seu art. 381, estabelece que a produção antecipada de provas é cabível quando, entre outros, "a prova a ser produzida seja suscetível de viabilizar a autocomposição ou outro meio adequado de solução de conflito" e "o prévio conhecimento dos fatos possa justificar ou evitar o ajuizamento de ação" (inciso II e III).

No caso, vê-se que a pretensão da apelante é ter o documento exibido "com a finalidade de verificar a regularidade da cobrança e de suas cláusulas" (fls. 02), o que se enquadra perfeitamente nesses incisos, uma vez que sua apresentação poderia viabilizar a solução do conflito extrajudicialmente, bem como "justificar ou evitar o ajuizamento de ação".

(...)"

(TJSP, Apelação n. 1015173-85.2016.8.26.0196, 37ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. José Tarciso Beraldo, j. 7.11.2017, v.u., grifou-se)

A ação autônoma de produção da prova, assim como o requerimento incidental de exibição de documento ou coisa, seguramente têm um fio condutor semelhante no que toca à vinda aos autos de determinada prova ou coisa, não obstante, por meio de ação autônoma, pelo procedimento comum, se obtenha semelhante providência, a corroborar boa parte dos fundamentos que revestem os precedentes supra citados.

A par de entendimentos diversos que tratam do mesmo tema, resta ao jurisdicionado a angústia de torcer para haver escolhido o nome correto da ação proposta ou procedimento eleito, cujo acerto ficará sujeito ao alvedrio da corrente jurisprudencial adotada.

A preocupação com o rótulo que reveste o nome de determinada ação é tema que vem perdendo importância na moderna doutrina processual voltada à ordem jurídica justa pautada no acesso à Justiça e efetividade da tutela jurisdicional. E a extinção da ação, sem resolução de mérito, para tema ainda controvertido, projeta efeitos perniciosos como esclarecer ao cliente o malogro do nome da ação ou procedimento escolhido, sem prejuízo de encargos sucumbenciais.

De toda sorte, diante da divergência de entendimentos para o mesmo fenômeno e a fim de se evitar qualquer surpresa ao jurisdicionado frente ao nome da ação ou procedimento mais adequado no entender do julgador, de bom alvitre a oportunidade de emenda da petição inicial nos termos do art. 321 do CPC/2015, "(...) indicando com precisão o que deve ser corrigido ou complementado."

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André Pagani de Souza é doutor, mestre e especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Bacharel em Direito pela USP. Professor de Direito Processual Civil e coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da Universidade Presbiteriana Mackenzie em São Paulo. Pós-doutorando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Autor de diversos trabalhos na área jurídica. Membro do IBDP, IASP e CEAPRO. Advogado.

Daniel Penteado de Castro é mestre e doutor em Direito Processual pela Universidade de São Paulo. Especialista em Direito dos Contratos pelo Centro de Extensão Universitária. Membro fundador e conselheiro do CEAPRO – Centro de Estudos Avançados em Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP. Professor na pós-graduação Lato Sensu na Universidade Mackenzie, Escola Paulista de Direito e Escola Superior da Advocacia. Professor de Direito Processual Civil na graduação do Instituto de Direito Público. Advogado e Autor de livros jurídicos.

Elias Marques de M. Neto Pós-doutorados em Direito Processual Civil na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (2015), na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra/Ius Gentium Conimbrigae (2019), na Faculdade de Direito da Universidade de Salamanca (2022) e na Universitá degli Studi di Messina (2024/2025). Visiting Scholar no Instituto Max Planck, em Direito Processual Civil e em Direito Constitucional (2023/2024). Doutor (2014) e Mestre (2009) em Direito Processual Civil pela PUC/SP. MBA em Gestão Empresarial pela FGV (2012). Especialista em Direito da Economia e da Empresa pela FGV (2006). Especializações em Direito Processual Civil (2004) e em Direito dos Contratos (2005) pelo IICS/CEU. Especialização em Direito do Agronegócio pela FMP (2024). MBA em Agronegócio pela USP (2025). MBA em Energia pela PUC/PR (2025). Pós Graduação Executiva em Negociação (2013) e em Mediação (2015) na Harvard Law School. Pós Graduação Executiva em Business Compliance na University of Central Florida - UCF (2017). Pós Graduação Executiva em Mediação e Arbitragem Comercial Internacional pela American University / Washington College of Law (2018). Pós Graduação Executiva em U.S. Legal Practice and ADR pela Pepperdine University/Straus Institute for Dispute Resolution (2020). Curso de Extensão em Arbitragem (2016) e em Direito Societário (2017) pelo IICS/CEU. Bacharel em Direito pela USP (2001). Professor Doutor de Direito Processual Civil no Curso de Mestrado e Doutorado na Universidade de Marilia - Unimar (desde 2014), nos cursos de Especialização do CEU-Law (desde 2016) e na graduação da Facamp (desde 2021). Professor Colaborador na matéria de Direito Processual Civil em diversos cursos de Pós Graduação Lato Sensu e Atualização (ex.: EPD, Mackenzie, PUC/SP-Cogeae e USP-AASP). Advogado. Sócio de Resolução de Disputas do TozziniFreire Advogados (desde 2021). Atuou como Diretor Executivo Jurídico e Diretor Jurídico de empresas do Grupo Cosan (2009 a 2021). Foi associado sênior do Barbosa Mussnich e Aragão Advogados (2002/2009). Apontado pela revista análise executivos jurídicos como o executivo jurídico mais admirado do Brasil nas edições de 2018 e de 2020. Na mesma revista, apontado como um dos dez executivos jurídicos mais admirados do Brasil (2016/2019), e como um dos 20 mais admirados (2015/2017). Recebeu do CFOAB, em 2016, o Troféu Mérito da Advocacia Raymundo Faoro. Apontado como um dos 5 melhores gestores de contencioso da América Latina, em 2017, pela Latin American Corporate Counsel Association - Lacca. Listado em 2017 no The Legal 500's GC Powerlist Brazil. Recebeu, em 2019, da Associação Brasil Líderes, a Comenda de Excelência e Qualidade Brasil 2019, categoria Profissional do Ano/Destaque Nacional. Recebeu a medalha Mérito Acadêmico da ESA-OABSP (2021). Listado, desde 2021, como um dos advogados mais admirados do Brasil na Análise 500. Advogado recomendado para Resolução de Disputas, desde 2021, nos guias internacionais Legal 500, Latin Lawyer 250, Best Lawyers e Leaders League. Autor de livros e artigos no ramo do Direito Processual Civil. Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP, Pinheiros (desde 2013). Presidente da Comissão de Energia do IASP (desde 2013). Vice Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP (desde 2019). Membro fundador e Conselheiro (desde 2023) do Ceapro, tendo sido diretor nas gestões de 2013/2023. Conselheiro curador da célula de departamentos jurídicos do CRA/SP (desde 2016). Membro de comitês do Instituto Articule (desde 2018). Membro da lista de árbitros da Camarb e da Amcham. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), do CBar e da FALP. Membro honorário da ABEP. Foi presidente da Comissão de Defesa da Segurança Jurídica do Conselho Federal da OAB (2015/2016), Conselheiro do CORT/FIESP (2017), Coordenador do Núcleo de Direito Processual Civil da ESA-OAB/SP (2019/2021) e Secretário da comissão de Direito Processual Civil do CFOAB (2019/2021).

Rogerio Mollica é doutor e mestre em Direito Processual Civil pela USP. Especialista em Administração de Empresas CEAG-Fundação Getúlio Vargas/SP. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. Bacharel em Direito pela USP. Professor doutor nos cursos de mestrado e doutorado na Universidade de Marilia - Unimar. Advogado. Membro fundador, ex-conselheiro e ex-presidente do Ceapro - Centro de Estudos Avançados de Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT).