CPC na prática

A sucumbência recursal vista pelos tribunais

A sucumbência recursal vista pelos tribunais.

5/10/2017

Rogerio Mollica

A sucumbência recursal, prevista no artigo 85, § 11º do Código de Processo Civil é uma das grandes inovações do novo CPC e uma das esperanças para que tenhamos uma diminuição dos recursos meramente protelatórios, a fim de se obter a tão almejada celeridade processual.

Por ser um instituto novo, ele ainda gera inúmeras dúvidas nos aplicadores do Direito. O Judiciário, aos poucos, vem enfrentando essas questões controvertidas.

Nesta coluna, em artigo datado de 13/4/2017, demonstrei que tendia a prevalecer o entendimento segundo o qual os honorários recursais além do caráter remuneratório, teriam o caráter punitivo, sendo desnecessária a apresentação de contrarrazões ao recurso ou mesmo qualquer ato do advogado do recorrido no tribunal a fim de justificar a sua fixação.

Tal entendimento acabou expresso no enunciado 07 do Conselho da Justiça Federal: "A ausência de resposta ao recurso pela parte contrária, por si só, não tem o condão de afastar a aplicação do disposto no art. 85, § 11, do CPC."

Uma outra questão que surge é sobre a possibilidade de se ter sucumbência recursal no caso de não haver condenação prévia em primeira instância. Por exemplo, a sentença não fixa honorários advocatícios devidos pelo réu sucumbente, o tribunal mantendo a sentença, poderia condenar o réu à sucumbência recursal?

O § 11 do artigo 85 é claro ao prever que "O Tribunal, ao julgar recurso majorará os honorários fixados anteriormente (...)". Pela leitura do dispositivo, parece claro que se não ocorreu a fixação anterior não há como fixar a sucumbência recursal. Entretanto, o referido § 11º também é cristalino ao prever que os honorários recursais levarão “em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal” e conforme visto acima, os honorários sucumbenciais vêm sendo fixados independentemente de ter havido trabalho adicional por parte do advogado.

Nesse caso, os Tribunais têm seguido a previsão legal, mesmo porque não há como majorar o que não foi nem ao menos fixado anteriormente. Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. PUBLICAÇÃO. NOME DE ADVOGADO DIVERSO DO CONSTITUÍDO. RESTITUIÇÃO DO PRAZO. AMPLA DEFESA PRESERVADA. NULIDADE. INEXISTENTE. IMPENHORABILIDADE SALARIAL. PRESERVAÇÃO. AUSÊNCIA DE CIRCUNSTÂNCIAS EXCEPCIONAIS. PENHORA DE COTAS DE COOPERATIVA. VIABILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS.

1. Execução ajuizada em 1997, da qual se extraiu o presente recurso especial, interposto em 30/08/2016 e concluso ao gabinete em 29/03/2017. Julgamento: CPC/15.

2. O propósito recursal é decidir sobre: i) a existência de nulidade processual decorrente de intimação em nome de advogado diverso do constituído pela parte; ii) a validade de penhora, no percentual de 30%, da renda mensal líquida da parte-executada; ii) a possibilidade de penhora de cotas de sociedade cooperativa da qual a parte-executada é cooperada.

3. No tratamento das nulidades processuais, a jurisprudência do STJ é firme no sentido de ser imprescindível a demonstração de efetivo prejuízo às partes. Assim, a restituição de prazo recursal permitiu o efetivo exercício da ampla defesa, afastando o prejuízo alegado pela parte. 4. A orientação desta Corte, ao permitir a aplicação mitigada da impenhorabilidade salarial, está muito bem delimitada para situações excepcionais em que efetivamente resta preservada a dignidade do devedor, no seu núcleo essencial. Não se pode tornar em regra geral e abstrata um tratamento excepcional direcionado a circunstâncias individuais e concretas detectadas caso a caso.

Precedentes.

5. É possível a penhora de cotas pertencentes a sócio de cooperativa, por dívida particular deste, pois responde o devedor, para o cumprimento de suas obrigações, com todos seus bens presentes e futuros (art. 591, CPC/73). Precedente da Terceira Turma.

6. Não haverá honorários de sucumbência recursal quando nas outras instâncias não houve a fixação em desfavor do recorrente. Isso porque o texto da lei prevê, expressamente, que somente serão majorados os "honorários fixados anteriormente", de modo que, não havendo arbitramento de honorários pelas instâncias ordinárias, não incidirá a regra do § 11 do art. 85 do CPC/15.

7. Recurso especial conhecido e parcialmente provido." (g.n.)

(REsp 1661990/MS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/08/2017, DJe 22/8/2017)

Dessa forma, também não se aplica o § 11 do artigo 85 do CPC aos recursos interpostos em Mandado de Segurança (MS), eis que, nos termos do artigo 25 da lei 12.016/2009, não cabe a condenação em honorários sucumbenciais em MS. Portanto, se não há a condenação, não pode haver a majoração em sede recursal1.

Outra controvérsia que surge é se teríamos a incidência da sucumbência recursal em face de remessa necessária (art. 496 do Novo CPC), eis que a doutrina majoritária entende que não se trataria de um recurso, pois na Remessa não temos os seguintes requisitos próprios dos recursos: a voluntariedade, a tipicidade, a dialeticidade, a legitimidade, o interesse, a tempestividade e o preparo.

Já tive oportunidade de defender que não há Sucumbência Recursal em virtude da Remessa Necessária, já que essa não é Recurso, mas o juiz deve ter em mente o trabalho adicional que ela causará ao advogado e pode/deve fixar os honorários acima da alíquota mínima em 1ª instância2.

Leonardo Carneiro da Cunha, mesmo defendendo que a Remessa Necessária seria um Recurso, entende que "não se aplica o § 11 do art. 85 do CPC no julgamento da remessa necessária. A majoração dos honorários só se dá no âmbito dos recursos voluntários, não se aplicando nos recursos de ofício, por não haver causalidade nesses últimos".

O mesmo entendimento é expresso no Enunciado nº 4 do Fórum Nacional do Poder Público (art. 85, §11, Lei 13.105/15): "A majoração dos honorários de sucumbência, prevista no § 11 do art. 85 do CPC, não se aplica ao julgamento da remessa necessária."

Cumpre citar o entendimento, em sentido contrário de Bruno Vasconcelos Carrilho Lopes, que entende que "a causa do prolongamento do processo é a abertura de uma oportunidade para o reexame em seu favor de decisão contrária aos seus interesses, e, em decorrência, ele deve arcar com o pagamento de honorários complementares no julgamento de segundo grau, única forma de remunerar todo o trabalho realizado pelo advogado da parte vencedora"3.

Os tribunais não têm fixado sucumbência recursais nesses casos, conforme se depreende dos seguintes recentes julgados do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais:

"REMESSA NECESSÁRIA/APELAÇÃO CÍVEL - SERVIDOR ESTADUAL - PAGAMENTO A MAIOR - ERRO DA ADMINISTRAÇÃO - RECEBIMENTO DE BOA FÉ - COBRANÇA POSTERIOR - IMPOSSIBILIDADE - CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - SENTENÇA ILÍQUIDA - DEFINIÇÃO DO PERCENTUAL EM SEDE DE LIQUIDAÇÃO - REMESSA NECESSÁRIA - ART. 85, § 11, DO CPC/2015 - INAPLICABILIDADE. - Nos casos em que a Administração, por um erro operacional, reconhece algum direito ao servidor que reflete no acréscimo de seus vencimentos, criando no mesmo a falsa expectativa de que os valores recebidos de boa-fé são legais e definitivos, não pode proceder posteriormente à cobrança de tais quantias. - Os valores de natureza não tributária devidos pela Fazenda Pública devem ser corrigidos pelo IPCA, a partir de quando o pagamento deveria ter sido feito, e sobre eles deve incidir juros de mora pelos índices da caderneta de poupança, nos moldes do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei 11.960/09, desde a citação. - O arbitramento dos honorários advocatícios devidos pelo ente público deve observar o disposto no art. 85, § 3º, do NCPC, com definição do percentual em sede de liquidação na hipótese de sentença ilíquida, nos termos do que preconiza o § 4º, inciso II, do mesmo dispositivo legal. - Não há que se falar em majoração dos honorários advocatícios, nos termos do art. 85, §11, do CPC/2015, no caso de julgamento da demanda em sede de remessa necessária, com prejuízo de eventual recurso voluntário interposto, tendo em vista a inexistência de sucumbência recursal." (g.n.)

(Processo nº 0548553-24.2014.8.13.0024, Rel. Juiz Convocado Adriano Mesquita Carneiro, Data Julgamento: 06/07/2017)

"Embargos de declaração - inexistência de vícios no julgamento - honorários de sucumbência recursal - remessa necessária - não aplicação - não acolhimento.
Não há majoração de honorários em instância recursal quando a sentença é reexaminada em remessa necessária, prejudicados os recursos interpostos pelas partes."

(Processo nº 6021351-90.2015.8.13.0024, Rel. Des. Marcelo Rodrigues, Data Julgamento: 22/8/2017)

Existem muitas outras controvérsias e dada a limitação de espaço, serão objeto de análise em um próximo artigo a ser publicada nesta coluna.

__________

1 Conforme Luiz Dellore em seus Comentários ao artigo 85 do CPC, in Teoria Geral do Processo: comentários ao CPC de 2015 – parte geral. São Paulo: Método, 2015, p. 299.

2 Cfr."A Remessa Necessária e o Novo Código de Processo Civil" in Advocacia Pública, coord. José Henrique Mouta Araújo, Leonardo carneiro da cunha, Salvador: Juspodivm, 2015, p. 461.

3 "Os honorários recursais no Novo Código de Processo Civil", in Revista do Advogado, n. 126, São Paulo: AASP, 2015, p. 31.

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André Pagani de Souza é doutor, mestre e especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Bacharel em Direito pela USP. Professor de Direito Processual Civil e coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da Universidade Presbiteriana Mackenzie em São Paulo. Pós-doutorando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Autor de diversos trabalhos na área jurídica. Membro do IBDP, IASP e CEAPRO. Advogado.

Daniel Penteado de Castro é mestre e doutor em Direito Processual pela Universidade de São Paulo. Especialista em Direito dos Contratos pelo Centro de Extensão Universitária. Membro fundador e conselheiro do CEAPRO – Centro de Estudos Avançados em Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP. Professor na pós-graduação Lato Sensu na Universidade Mackenzie, Escola Paulista de Direito e Escola Superior da Advocacia. Professor de Direito Processual Civil na graduação do Instituto de Direito Público. Advogado e Autor de livros jurídicos.

Elias Marques de M. Neto Pós-doutorados em Direito Processual Civil na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (2015), na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra/Ius Gentium Conimbrigae (2019), na Faculdade de Direito da Universidade de Salamanca (2022) e na Universitá degli Studi di Messina (2024/2025). Visiting Scholar no Instituto Max Planck, em Direito Processual Civil e em Direito Constitucional (2023/2024). Doutor (2014) e Mestre (2009) em Direito Processual Civil pela PUC/SP. MBA em Gestão Empresarial pela FGV (2012). Especialista em Direito da Economia e da Empresa pela FGV (2006). Especializações em Direito Processual Civil (2004) e em Direito dos Contratos (2005) pelo IICS/CEU. Especialização em Direito do Agronegócio pela FMP (2024). MBA em Agronegócio pela USP (2025). MBA em Energia pela PUC/PR (2025). Pós Graduação Executiva em Negociação (2013) e em Mediação (2015) na Harvard Law School. Pós Graduação Executiva em Business Compliance na University of Central Florida - UCF (2017). Pós Graduação Executiva em Mediação e Arbitragem Comercial Internacional pela American University / Washington College of Law (2018). Pós Graduação Executiva em U.S. Legal Practice and ADR pela Pepperdine University/Straus Institute for Dispute Resolution (2020). Curso de Extensão em Arbitragem (2016) e em Direito Societário (2017) pelo IICS/CEU. Bacharel em Direito pela USP (2001). Professor Doutor de Direito Processual Civil no Curso de Mestrado e Doutorado na Universidade de Marilia - Unimar (desde 2014), nos cursos de Especialização do CEU-Law (desde 2016) e na graduação da Facamp (desde 2021). Professor Colaborador na matéria de Direito Processual Civil em diversos cursos de Pós Graduação Lato Sensu e Atualização (ex.: EPD, Mackenzie, PUC/SP-Cogeae e USP-AASP). Advogado. Sócio de Resolução de Disputas do TozziniFreire Advogados (desde 2021). Atuou como Diretor Executivo Jurídico e Diretor Jurídico de empresas do Grupo Cosan (2009 a 2021). Foi associado sênior do Barbosa Mussnich e Aragão Advogados (2002/2009). Apontado pela revista análise executivos jurídicos como o executivo jurídico mais admirado do Brasil nas edições de 2018 e de 2020. Na mesma revista, apontado como um dos dez executivos jurídicos mais admirados do Brasil (2016/2019), e como um dos 20 mais admirados (2015/2017). Recebeu do CFOAB, em 2016, o Troféu Mérito da Advocacia Raymundo Faoro. Apontado como um dos 5 melhores gestores de contencioso da América Latina, em 2017, pela Latin American Corporate Counsel Association - Lacca. Listado em 2017 no The Legal 500's GC Powerlist Brazil. Recebeu, em 2019, da Associação Brasil Líderes, a Comenda de Excelência e Qualidade Brasil 2019, categoria Profissional do Ano/Destaque Nacional. Recebeu a medalha Mérito Acadêmico da ESA-OABSP (2021). Listado, desde 2021, como um dos advogados mais admirados do Brasil na Análise 500. Advogado recomendado para Resolução de Disputas, desde 2021, nos guias internacionais Legal 500, Latin Lawyer 250, Best Lawyers e Leaders League. Autor de livros e artigos no ramo do Direito Processual Civil. Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP, Pinheiros (desde 2013). Presidente da Comissão de Energia do IASP (desde 2013). Vice Presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB/SP (desde 2019). Membro fundador e Conselheiro (desde 2023) do Ceapro, tendo sido diretor nas gestões de 2013/2023. Conselheiro curador da célula de departamentos jurídicos do CRA/SP (desde 2016). Membro de comitês do Instituto Articule (desde 2018). Membro da lista de árbitros da Camarb e da Amcham. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), do CBar e da FALP. Membro honorário da ABEP. Foi presidente da Comissão de Defesa da Segurança Jurídica do Conselho Federal da OAB (2015/2016), Conselheiro do CORT/FIESP (2017), Coordenador do Núcleo de Direito Processual Civil da ESA-OAB/SP (2019/2021) e Secretário da comissão de Direito Processual Civil do CFOAB (2019/2021).

Rogerio Mollica é doutor e mestre em Direito Processual Civil pela USP. Especialista em Administração de Empresas CEAG-Fundação Getúlio Vargas/SP. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. Bacharel em Direito pela USP. Professor doutor nos cursos de mestrado e doutorado na Universidade de Marilia - Unimar. Advogado. Membro fundador, ex-conselheiro e ex-presidente do Ceapro - Centro de Estudos Avançados de Processo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT).