O Código de Processo Civil de 2015 positivou grandes avanços no que tange à disciplina dos honorários advocatícios. O diploma pacificou divergências jurisprudenciais e uniformizou o entendimento acerca de diversos aspectos da matéria, garantindo dignidade e segurança jurídica ao exercício profissional da advocacia, função essencial à administração da justiça, nos dizeres constitucionais. Todavia, a classe ainda enfrentava problemas quando se tratava da fixação de honorários por equidade, haja vista sua aplicação arbitrária e mesmo contrária à expressa previsão legal.
O parágrafo 8º do artigo 85 do CPC estabelece que nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do parágrafo 2º, isto é, o grau de zelo do profissional; o lugar de prestação do serviço; a natureza e a importância da causa; o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
A citada previsão não modifica substancialmente o disposto no parágrafo 4º do artigo 20, CPC/1973, inclusive os parâmetros a serem observados pelo juiz ao fixar o valor dos honorários sucumbenciais nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico seguem os mesmos, com igual redação ao CPC revogado.
Cabe dizer que as causas de “valor inestimável” são aquelas em que não se vislumbra benefício patrimonial imediato, como as pertinentes ao estado e à capacidade das pessoas, tais como divórcio, anulação de casamento, interdição e emancipação, por exemplo1. Já o “irrisório proveito” não é definido ou delimitado pelo atual CPC, de tal sorte, que diante da ausência de parâmetro monetário que estabeleça limites ao que pode ser considerado irrisório, o ajuste dos valores acaba por ficar exposto aos critérios subjetivos do juiz. O termo equidade, por sua vez, não possui conceito preciso, mas busca revelar a ideia de “justiça do caso concreto”, em que o julgador deve considerar as especiais circunstâncias que o cercam, e as condições pessoais dos envolvidos na demanda.2
Com a vagueza dos termos vinculados ao juízo de arbitramento, assim como a própria subjetividade do julgador, havia grande disparidade no arbitramento dos honorários sucumbenciais. De modo a ordenar esta situação, a recente Lei nº 14.365, de 2 de junho de 2022, acrescentou o parágrafo 8º-A ao artigo 85 do CPC/2015, prevendo que o juiz deverá observar os valores recomendados pelo Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil a título de honorários advocatícios ou o limite mínimo de 10% (dez por cento) estabelecido no parágrafo 2º do mesmo artigo, aplicando-se o que for maior.
O acréscimo do parágrafo 8º-A ao artigo 85, CPC/2015, é um avanço na lei e um marco legal para a subsistência da advocacia. O CPC agora fixa índices e retira a subjetividade que a apreciação do termo equidade pode conferir, pois tradicionalmente resultava no aviltamento dos honorários. O novo normativo contemplou o entendimento fixado no Tema 1.0763 dos recursos repetitivos no Superior Tribunal de Justiça, julgado em março de 2022. O Tribunal pacificou o entendimento de que a equidade somente deverá ser utilizada como parâmetro no arbitramento dos honorários de sucumbência nas causas em que o proveito econômico for irrisório ou inestimável, ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo; sendo vedada quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados.
Notadamente a advocacia se via injustiçada em relação aos honorários sucumbenciais a serem recebidos, pois antes do acréscimo do parágrafo 8º-A ao artigo 85 do CPC/2015, tinha-se a seguinte situação: quando os valores a serem recebidos eram baixos, a advocacia estava sujeita ao crivo e bom senso do magistrado para o recebimento de honorários sucumbenciais justos, e muitas vezes os valores recebidos eram ínfimos, todavia, quando os valores auferidos a título de honorários sucumbenciais, em estrito cumprimento da previsão legal, deveriam ser elevados, muitas vezes o juiz da causa atuava para que a previsão do CPC fosse aplicada à parte e os honorários fossem minorados. Esta situação evidenciava o prejuízo para a classe advocatícia quaisquer que fossem as situações.
A decisão do STJ no tema repetitivo 1076 avançou em relação à jurisprudência firmada pelo Tribunal durante a vigência do CPC de 1973, que tinha por base as situações em que a Fazenda Pública fosse vencida. Ocorre que o parágrafo 3º do artigo 85, CPC/2015, já prevê a fixação escalonada da verba de sucumbência nas causas em que a Fazenda Pública for parte no litígio, impedindo o enriquecimento sem causa do advogado da parte adversa e a fixação de honorários excessivamente elevados contra o ente público, logo, acertadamente, a mais recente decisão do STJ avançou na garantia à justa remuneração aos advogados vencedores em demandas judiciais.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, de modo diverso, admite que em hipóteses nas quais o valor da causa e/ou do proveito econômico almejado seja muito alto, a fixação de honorários advocatícios sucumbenciais se dê por equidade4. Esta jurisprudência certamente será superada, em virtude da mencionada mudança legislativa no Código de Processo Civil. Em recente oportunidade, quando instado a se manifestar sobre majoração de honorários sucumbenciais em fase recursal, o tribunal pleno do STF decidiu apenas por dobrar o percentual fixado no juízo de origem, que era de 1%, cumprindo o previsto no artigo 85, parágrafo 11, do CPC/2015 (honorários recursais), haja vista a fixação por equidade ter se dado na vigência do CPC/19735 , mas já agrega a recente mudança no CPC ao exame da causa.
Por fim, é de se ressaltar a grande conquista da advocacia brasileira com as recentes garantias legais. Atualmente, embora persista a previsão de equidade no arbitramento dos honorários sucumbenciais, a nova legislação afastou a subjetividade e vagueza do termo, ao estabelecer que a tabela de honorários da OAB será o parâmetro nas causas de baixo valor. Também foi superada a problemática aplicação da equidade quando os valores a serem auferidos pelos advogados forem elevados, com a reafirmação do percentual mínimo de 10%, tal qual prevê o parágrafo 2º do artigo 85, CPC/2015.
Os honorários sucumbenciais compõem importante parcela dos proventos de muitos advogados e assim como honorários contratuais são verbas de natureza alimentar. Defender o avanço e a garantia do exercício profissional digno e respeitado é, em última instância, defender o acesso à justiça e a garantia de direitos aos cidadãos. O advogado é a voz do cidadão nas disputas judiciais e a sua valorização é indispensável à prestação do seu serviço com autonomia, independência e dignidade.
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1 ALVIM, J.E. Carreira. Comentários ao Novo Código de Processo Civil - Lei 13.105, de 16 de Março de 2015 - Atualizada pela Lei 13.256, de 04 de Fevereiro de 2016 - Volume II - Arts. 82 ao 148. Curitiba: Juruá, 2015, p. 50.
2 ALVIM, J.E. Carreira. Comentários ao Novo Código de Processo Civil - Lei 13.105, de 16 de Março de 2015 - Atualizada pela Lei 13.256, de 04 de Fevereiro de 2016 - Volume II - Arts. 82 ao 148. Curitiba: Juruá, 2015, p. 50.
3 i) A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória nesses casos a observância dos percentuais previstos nos §§ 2º ou 3º do artigo 85 do CPC - a depender da presença da Fazenda Pública na lide -, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa. ii) Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo.
4 Rcl 43869 AgR-ED-segundos-ED, Relator(a): ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 27/09/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-240 DIVULG 03-12-2021 PUBLIC 06-12-2021.
5 ARE 1374233 AgR, Relator(a): LUIZ FUX (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 21/06/2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-126 DIVULG 28-06-2022 PUBLIC 29-06-2022).