A celeridade, contribuindo para a pacificação o quanto antes, e a ampla defesa, direcionada a qualidade e estabilidade da prestação jurisdicional, são duas exigências contrapostas. O CPC buscou contempla-las, dando efetividade aos dois postulados constitucionais, a razoável duração do processo e o devido processo legal.
O novel Diploma Processual Civil, com acerto, emprestou relevante ênfase à efetividade do processo. Assumindo a compreensão de que o processo não é um fim em si mesmo, mas um instrumento do qual as partes se valem para alcançar a satisfação de um direito pleiteado perante o Estado-Juiz, o Código estabeleceu uma série de dispositivos buscando garantir a efetiva entrega da jurisdição.
Nessa senda, em seu artigo 4º, o CPC reproduziu o princípio de natureza constitucional da razoável duração do processo, assim consignando: "As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa".
Historicamente, o processo civil brasileiro tem sido alvo de críticas em razão da excessiva demora na resolução dos conflitos. O apego à forma em detrimento da instrumentalidade dos atos processuais muitas vezes resultou em sua ineficácia em solucionar os conflitos sociais. Por essa razão, a Emenda Constitucional nº 45 alçou, em 2004, a duração razoável do processo a status de direito fundamental.
O Código não estabeleceu um lapso temporal fixo para a tramitação processual, tarefa que seria demasiadamente complexa e, se estipulada em abstrato, certamente geraria mais prejuízo do que benefício às partes. A razoabilidade quanto à duração do processo é conceito aberto e abstrato, mas há critérios que podem orientar essa verificação, como a complexidade da causa, o comportamento das partes, os meios necessários de provas, a condução do magistrado entre outros.
A norma do artigo 4º não prevê sanções dirigidas à parte que der causa à extrapolação da duração razoável da causa. Isso porque os litigantes não são os destinatários desse preceito. Luiz Guilherme Marinoni, ao comentar o dispositivo pontua que "o seu conteúdo mínimo está em determinar: i) ao legislador, a adoção de técnicas processuais que viabilizem a prestação da tutela jurisdicional dos direitos em prazo razoável (...), ii) ao administrador judiciário, a adoção de técnicas gerenciais capazes de viabilizar o adequado fluxo dos atos processuais..., iii) ao Juiz, a condução do processo de modo a prestar a tutela jurisdicional em prazo razoável, inclusive com a adoção de técnicas de gestão capazes de dispensar intimação para a prática de atos processuais1".
Fredie Didier destaca a existência de instrumentos que podem servir para concretizar o direito fundamental à razoável duração do processo: "a) representação por excesso de prazo, com a possível perda da competência do juízo em razão da demora (art. 235, CPC); b) mandado de segurança contra a omissão judicial, caracterizada pela não prolação da decisão por tempo não razoável, cujo pedido será a cominação de ordem para que se profira a decisão; c) se a demora injusta causar prejuízo, ação de responsabilidade civil contra o Estado, com possibilidade de ação regressiva contra o juiz; d) a EC n. 45/2004 também acrescentou a alínea "e" ao inciso II do art. 93 da CF , estabelecendo que não será promovido o juiz que, injustificadamente, retiver autos em seu poder além do prazo legal , não podendo devolvê-los ao cartório sem o devido despacho ou decisão; e) a reclamação por usurpação de competência também pode ser utilizada, quando a usurpação se dá por atos omissivos2".
Além das obrigações dirigidas ao legislador, ao administrador judiciário e ao juiz, o artigo 5º do CPC estabeleceu o dever das partes de observância da boa-fé: "aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé”. Bem assim, no artigo 6º, consagrou o princípio da cooperação, instituindo que: “todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva".
Veja-se que os três dispositivos aqui mencionados (artigos 4º, 5º e 6º) guardam uma complementariedade entre si: o comportamento consoante à boa-fé e a cooperação entre as partes são condutas que convergem para o alcance da solução do conflito em tempo razoável.
Diferente da previsão do Código de 1973, em seu art. 14, II, que tratava da boa-fé subjetiva, o artigo 5º do atual Código disciplina a boa-fé objetiva, consistindo num atributo do comportamento dos sujeitos do processo, independentemente do elemento volitivo. Isto é, "basta que determinado ato processual seja apontado como desleal, em uma visão objetiva, para que seu agente, independentemente de ter agido com boa intenção, seja considerado incurso em má-fé3".
Assim, o juiz, na condução do processo, poderá punir as partes que incorrerem em atos procrastinatórios, aplicando multas por litigância de má-fé, como forma de coibir práticas abusivas e dilações indevidas e, ao mesmo tempo, de propiciar compensações aos que, de alguma maneira, forem prejudicados com a demora no processo.
Como dito, o código também instituiu um princípio geral de cooperação que orienta a conduta de todos os envolvidos no processo – partes, servidores, oficiais de justiça, testemunha, peritos etc. – exigindo-lhes que atuem em prol de uma adequada e célere solução da causa, sem desconsiderar o necessário contraditório e ampla defesa das partes.
O princípio da cooperação, conforme leciona Guilherme Rizzo Amaral, "impõe que o juiz colabore com as partes e que as partes colaborem com o Juízo". No tocante à colaboração das partes, trata-se no fornecimento de informações e subsídios que possam subsidiar o juiz na tomada de decisão ao longo do processo. Já no que se refere ao juiz, trata-se de deveres elencados pela doutrina do magistrado em relação aos demais sujeitos do processo a fim de viabilizar a atuação destes na persecução de seus objetivos. São os deveres de i) esclarecimento, ao elucidar eventuais dúvidas, ii) diálogo, ao colher o posicionamento das partes, visando delimitar a controvérsia e formar sua convicção, iii) auxílio e iv) prevenção, ambos aspectos inerentes à superação das etapas processuais: intimação, colheita de provas, constrição de bens etc4.
Como visto, a busca pela razoável duração do processo é um objetivo legítimo e que tenciona assegurar, no plano material, o bem da vida pleiteado juridicamente. Todavia, conforme provocação de Fredie Didier, importante que se faça uma reflexão a esse respeito. O processualista chama atenção para a questão de que não há um "princípio da celeridade", ou seja, o processo não tem que ser célere, "o processo deve demorar o tempo necessário e adequado à solução do caso submetido ao órgão jurisdicional".
Ora, as garantias processuais são uma conquista histórica dos sujeitos e cidadãos a uma aplicação justa e ponderada do direito e suas normas. É o processo que garante a igualdade entre as partes na lide, a oportunidade de se contraporem às alegações da parte adversa, de produzirem provas, ao duplo grau de jurisdição, entre outros. Todas essas garantias, como é de se esperar, implicam em certo dispêndio de tempo. Todavia, esse tempo é necessário à garantia de um devido processo legal, justo, adequado e que respeite os direitos das partes. "É preciso fazer o alerta para evitar discursos autoritários, que pregam a celeridade como valor. Os processos da Inquisição poderiam ser rápidos. Não parece, porém, que se sinta saudade deles".
A celeridade e a justiça compõem, portanto, um binômio que exige delicado equilíbrio. De um lado, muita celeridade implica, quase sempre, em procedimentos que passam por cima de garantias fundamentais ou que geram resultados injustos. De outro lado, excesso de garantias, geram procedimentos intermináveis e injustos porque ineficazes. Por essa razão, o princípio da razoável duração do processo deve ser compreendido sempre em conjunto com as garantias processuais, a fim de se assegurar não apenas a promulgação de uma decisão em tempo razoável, mas que o conteúdo dessa decisão seja adequado e justo.
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1 MARINONI, Luiz Guilherme. Novo Código de Processo Civil, São Paulo, RT, 2015, p. 97.
2 DIDIER, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Introdução ao Direito Processual Civil, Parte Geral e Processo de Conhecimento. Salvador: Ed. Juspodivm, 2019, p. 125-126.
3 ALVIM, Angélica Arruda et. al. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 59.
4 ALVIM, Angélica Arruda et. al. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 60.