Opinião: Ninguém melhor do que uma mulher para falar pelas mulheres
Na última terça-feira, a ministra Cármen Lúcia, já à frente da Suprema Corte, se reuniu com os presidentes dos Tribunais de Justiça do país. Na foto da reunião, tirando uma única presidente participante, todo o restante era formado por homens. No mesmo dia, a presidente esteve com mais de 20 governadores. Havia somente uma mulher, a governadora de Roraima, Suely Campos. Não é que as outras faltaram. Não há outras. Dia seguinte, na sessão do pleno do Tribunal, a ministra Cármen teve de ouvir alguns colegas, homens – num colegiado cuja proporção de gênero é de nove homens para duas mulheres – falarem sobre como as mulheres ocupam lugares de destaque na sociedade. Foi a gota que faltava para derramar toda a água do copo. A presidente desabafou: "Há tanta discriminação contra a mulher, ao contrário do que aqui foi dito, - que temos mulheres conduzindo Boeing e isso e aquilo –... a simples referência disso, já demonstra a discriminação, porque ninguém fala que tinha um homem sentado aqui desde 1828 nesse Supremo Tribunal de Justiça e que isso era novidade". Diante do silêncio eloquente do pleno, a ministra continuou: "Há, sim, discriminação contra a mulher. Há, sim, a discriminação mesmo em casos de nós, juízas, que conseguimos chegar a posições de igualdade. Há, sim, enorme preconceito contra nós, mulheres, em todas as profissões. Eu convivo com mulheres que o tempo todo são discriminadas", arrematou. A discriminação contra a mulher, no Brasil, não tem cor, partido político, classe social ou ideologia. Ela tanto habita a natureza criminosa do agressor brutal, como a face envergonhada de engravatados das altas rodas com suas piadas e estereótipos. A esperança a ser alimentada por nós nessa questão é a mesma frisada pela escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, no seu "We should all be feminists", quando diz: "Gênero importa em todos os lugares do mundo. E eu gostaria, hoje, de dizer que nós deveríamos começar a sonhar e planejar um mundo diferente. Um mundo mais justo. Um mundo de homens mais felizes e mulheres mais felizes que sejam mais fiéis a si mesmo". A presidente da Suprema Corte está fazendo a parte dela. Mulheres em todo o mundo também estão. Resta, a nós, homens, demonstrarmos toda a nossa empatia a essa causa e, alimentando os anjos bons da nossa natureza, rasgarmos esse manto tenebroso que ainda cobre a nossa vista: o manto do machismo e, ao lado dele, da discriminação contra a mulher.
FIESP pede ingresso no debate sobre CSL - Coisa Julgada
A FIESP pediu ingresso como amicus curiae no RE 955.227/BA (min. Luís Roberto Barroso), com repercussão geral, que visa "saber se e como as decisões do STF em controle difuso fazem cessar os efeitos futuros da coisa julgada em matéria tributária, quando a sentença tiver se baseado na constitucionalidade ou inconstitucionalidade do tributo". É a importante tese da "CSL – Coisa Julgada".
Esclarecimento quanto tese dos resíduos domiciliares
Foram opostos embargos de declaração ao RE 847.429/SC (min. Dias Toffoli), apontando que, na decisão embargada, que reconheceu a repercussão geral, "a possibilidade de delegação, mediante contrato de concessão, do serviço de coleta e remoção de resíduos domiciliares" não está sendo questionada, devendo, o julgamento, ater-se à forma de remuneração de tais serviços concedidos.
IPI na revenda
O ministro Marco Aurélio despachou as petições apresentadas no RE 946.648/SC, cujo tema, com repercussão geral, versa sobre a eventual dupla incidência de IPI na revenda de bem industrializado. A FIESP foi admitida como terceira interessada. Quanto à alegação de que o quórum necessário para o reconhecimento da repercussão geral não teria sido atingido, o ministro anotou: "O quórum de 2/3, referente ao afastamento da repercussão geral, não foi alcançado. Há de aguardar-se a liberação do processo para inserção na pauta do Plenário físico e, aí, ocorrer a apreciação de aspectos ligados ao extraordinário". Por fim, quanto ao pedido de suspensão de todos os casos que versem sobre a matéria na jurisdição nacional, o ministro Marco Aurélio recusou a aplicação do CPC/2015: "A cláusula do inciso II do artigo 1.037 do Código de Processo Civil há de ser observada com extremo cuidado, surgindo própria em casos excepcionais, o que não se verifica na espécie. Uma coisa é, ante a repercussão geral admitida, suspender-se o envio de processos que, em Tribunais, estejam prontos para exame do Supremo. Algo diverso é implementar-se, de forma linear, a suspensão, seja qual for a fase, de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem o tema em debate", fundamentou.
Vida nova
Começaram as redistribuições para o ministro Ricardo Lewandowski de recursos com repercussão geral da relatoria da ministra Cármen Lúcia. O AI 837.409/SE, por exemplo, trata do seguinte: "IPTU. Execução fiscal. Competência tributária ativa. Declaração de inconstitucionalidade de dispositivo que definia limites territoriais de município. Requisitos contidos no art. 18, § 4º, da CF. Mitigação. Discussão quanto à correta aplicação do art. 96 da CF". Também o RE 590.186/RS: "IOF nas operações de mútuo praticadas entre pessoas jurídicas ou entre pessoas jurídicas e pessoas físicas segundo as mesmas regras aplicáveis às operações praticadas pelas instituições financeiras. Art.13 da lei 9.779/99".
Mais casos são liberados
Foi liberada para inclusão em pauta a ADI 3.144/DF (min. Edson Fachin), ajuizada pela CNC contra a Lei 10.833/2003 (COFINS não-cumulatividade). Também a ADI 2.237/DF (min. Cármen Lúcia), da Confederação Nacional das Profissões Liberais, cujo tema é: "Arts. 625-D e 625-E da CLT, inseridos pela lei 9.958/2000. Obrigatoriedade de submissão de demanda trabalhista a Comissão de Conciliação Prévia (CCP). Inocorrência. Inafastabilidade da jurisdição. Eficácia geral de termo de conciliação firmado por CCP. Efeito restrito aos direitos objeto da demanda". Foi liberada ainda a ADI 3.692/SP, ajuizada pelo governador do DF contra o art. 36, §3º, da lei 6.374/89, do Estado de SP, que veda o aproveitamento de créditos provenientes de operações ou prestações realizadas com contribuintes que fruem de benefícios fiscais em outras Unidades da Federação, sem a devida autorização do CONFAZ, sob o fundamento de que não houve recolhimento na etapa anterior.
ICMS na base da Cofins
A Fazenda Nacional segue com sua pretensão de ver suspensos todos os casos que, na jurisdição nacional, tratem da exclusão do ICMS na base de cálculo da Cofins. Os procuradores da Fazenda Cláudio Seefelder e Alexandra Carvalho, que fizeram o pedido de sobrestamento para a ministra Cármen Lúcia, relatora do leading case do tema com repercussão geral, o RE 574.706/PR, agendaram semana passada audiência com o ministro Gilmar Mendes, no TSE e, essa semana, com o ministro Roberto Barroso, no Salão Branco do STF. A suspensão seria providencial à coerência interna da jurisprudência nacional.
Destaque da semana
O governador do DF ajuizou no STF a ADC 46 arguindo a constitucionalidade dos artigos 6º, § 7º e 57 da lei 11.101/2015, bem como do artigo 191-A do CTN. O relator é o ministro Celso de Mello. Segundo a ação, a jurisprudência vem restringindo os direitos do fisco de providenciar o regular processamento dos executivos fiscais em face de devedores em recuperação judicial, pela argumentação de que em última análise reconhecem uma inconstitucionalidade dos artigos 6º, §7º e 57 da lei 11.101/05 (Lei de Recuperação Judicial e Extrajudicial), que não prevalece, tendo em vista que tais dispositivos são perfeitamente constitucionais, perante, principalmente, o art. 191-A do CTN. Também foi ajuizada, pelo governador do DF, a ADI 5.590/DF, visando o reconhecimento da inconstitucionalidade do § 4º ao art. 128 da Lei Orgânica do DF, tanto na sua redação original quanto na redação conferida pela Emenda à Lei Orgânica 80/2014. A referida norma prevê que os projetos de lei que instituam ou majorem tributos somente podem tramitar no âmbito da Câmara Legislativa em um determinado exercício financeiro se tiverem sido encaminhados antes de 90 dias do encerramento do correlato exercício. A relatoria é do ministro Teori Zavascki.
Tá na pauta
Consta como primeiro item da pauta do pleno do STF, para a próxima quarta-feira (21/9), o RE 898.060/SC (min. Luiz Fux), cujo tema, com repercussão geral, é o seguinte: "Família. Filiação. Direito Civil. Paternidade Biológica. Paternidade Socioafetiva". Quanto ao assunto, veja a análise feita pelas jovens pesquisadoras Isabela Oliveira Pannunzio e Cássia Kinoshita. O item seguinte é a ADI 3792/RN (min. Dias Toffoli), que trata da "constitucionalidade da obrigatoriedade de Plantão no escritório de prática jurídica mantido pelo curso de Direito da UERN".
Análise
Tramita no STF o ARE 743.485/SP (min. Marco Aurélio), do Consórcio Intermunicipal da Bacia do Juquery contra a Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo, cujo tema, com repercussão geral (nº 854) é o seguinte: "Possibilidade de implementação da prestação de serviço público de transporte coletivo, considerado o art. 175 da Constituição Federal, mediante simples credenciamento, sem licitação". Como cidadã constitucional que é, Luísa de Almeida Andrade, uma dedicada jovem pesquisadora, acadêmica de Direito da UnB, expressa suas compreensões sobre o assunto, tão importante na concretização do direito à cidade. O material pode ser acessado aqui.
Global constitutionalism
A Suprema Corte de Israel entendeu ser constitucional uma lei que permite a alimentação forçada de prisioneiros que se impõem greve de fome. A Corte negou pedidos da Associação de Médicos de Israel e de inúmeros grupos de defesa de direitos humanos. Para os juízes, a lei em análise, que lidava com questões relativas a pacientes médicos – vedando o procedimento - não abordava perfeitamente a situação dos prisioneiros que, em greve de fome, estavam numa situação extraordinária, não contemplada na legislação, que havia sido emendada. O vice-presidente do Tribunal, Elyakim Rubinstein, acompanhado dos juízes Noam Sohlberg e Meni Mazuz, permitiram a intervenção estatal em favor da vida daqueles que, geralmente abraçando causas políticas, usam a greve de fome como arma ideológica que coloca em risco a vida e a saúde. Para a Associação de Médicos de Israel, a alimentação forçada equivale à tortura e os médicos serão orientados a não fazerem a intervenção forçada.
Evento
Dia 28/9 (quarta-feira), às 19h, no Auditório da Biblioteca do UniCeub, em Brasília, o Instituto de Diálogos Constitucionais (IDCON), num convite feito pelo ministro Luís Roberto Barroso, receberá os professores Carlos Bernal Pulido (Macquire Law School – Austrália) e Richard Albert (Boston College Law School – EUA) para falarem sobre aspectos do Constitucionalismo Global. O professor Carlos discorrerá sobre o "Princípio da Proporcionalidade e Direitos Fundamentais" e o professor Richard sobre "Como as Cortes se tornam supremas: o poder de invalidares emendas constitucionais".
Obiter dictum
Na quarta-feira, durante o julgamento do RE 658.312/SC, que discute a recepção, pela Constituição Federal de 1988, do art. 384 da CLT, que prevê o intervalo de 15 minutos para mulheres antes da jornada extraordinária, a ministra Cármen Lúcia, aparteando o ministro Gilmar Mendes, exortava a necessidade de respeito aos direitos das mulheres. Foi quando um diálogo entre os dois quebrou o clima tenso da sessão:
Ministra Cármen: "A identidade de cada um é diferente entre homens e mulheres, graças a Deus. Dá certinho esse negócio de homem e mulher. É ótimo!".
Ministro Gilmar: "Ninguém nega isso, ministra".
Ministra Cármen: "Claro! Pelo amor de Deus. Só falta Vossa Excelência pedir vista disso também".