Conversa Constitucional

Conversa Constitucional nº 6

"No Brasil, não há limites jurídicos que contenha a força da política historicamente provinciana."

5/9/2016

Opinião: junto à Constituição, fatiaram as nossas esperanças

Um destaque para Votação em Separado (DVS) apresentado no final da votação do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff operou, no Senado Federal, um milagre: a mandatária, cassada, não sofreu a inabilitação de oito anos. O art. 52, parágrafo único, da Constituição Federal determina que a eventual condenação gera "perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis". Interpretaram o que não cabe interpretação. É como se o TSE, cassando um governador por compra de voto, entendesse que, apesar do crime eleitoral, o mandatário, cassado, tinha um bom coração e, portanto, não deveria sofrer a inelegibilidade de oito anos. No caso do impeachment, a medida provou que, no Brasil, não há limites jurídicos que contenha a força da política historicamente provinciana. E não foi a primeira vez. Em 2002, o então presidente do TSE, ministro Nelson Jobim, encontrou, no art. 17, I, da Constituição, a expressão "caráter nacional", em referência aos partidos. Interpretando-a, fez nascer a chamada verticalização das coligações partidárias que, ao tempo, militava em favor do então candidato a presidente José Serra (PSDB). Pela interpretação, "os partidos políticos que ajustarem coligação para eleição de presidente da República não poderão formar coligações para eleição de governador de Estado ou do Distrito Federal, senador, deputado Federal e deputado estadual ou distrital com outros partidos políticos que tenham, isoladamente ou em aliança diversa, lançado candidato à eleição presidencial". Esse estatuto, ausente do texto constitucional, estava, segundo o ministro Jobim, contido na expressão "caráter nacional". De nada adiantou. Quando as urnas foram abertas, estava eleito Luís Inácio Lula da Silva (PT). Essas posturas mostram que, diante do capricho dos homens e mulheres que fazem política no país, sucumbem a certeza das leis e a segurança do Direito. No Senado, não se fatiou somente a Constituição. Fatiou-se, também, a esperança de que não precisamos temer pois vivemos, qualquer que seja a circunstância, sob um governo das leis. Ficou claro que não, não vivemos. 

Ministro Fachin suspende casos que tratem de CSL - coisa julgada

O ministro Edson Fachin determinou a suspensão de todos os casos que tramitam na jurisdição nacional tratando do Tema 881 da repercussão geral, que é o seguinte: "Limites da coisa julgada em matéria tributária, notadamente diante de julgamento, em controle concentrado pelo STF, que declara a constitucionalidade de tributo anteriormente considerado inconstitucional, na via do controle incidental, por decisão transitada em julgado". No RE 949.297/CE, o ministro Fachin anotou: "Reconhecida a repercussão geral, impende a suspensão do processamento dos feitos pendentes que versem sobre a presente questão e tramitem no território nacional, por força do art. 1.035, §5º, do CPC".

Ministra Cármen Lúcia libera casos tributários e preserva sua competência

Preservando a relatoria de importantes disputas tributárias, a ministra Cármen Lúcia, prestes a assumir a presidência do STF, tem liberado para julgamento casos de relevo. Primeiramente, a ADI 2.044/RS, da CNC, cuja cautelar foi indeferida décadas atrás, tratando de ICMS - substituição tributária autorizada pelo § 7º acrescentado ao art. 150 da Constituição pela Emenda 3/93, tendo como base de cálculo o valor do estoque de mercadorias. Ainda, a ADI 2.446/DF, também da CNC, que impugna o art. 116 do CTN, que admite à autoridade administrativa desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, a título de combater a elisão fiscal. Também a ADI 5.165/DF, do Conselho Federal da OAB, sobre a supressão do efeito suspensivo automático nos embargos à execução (incidência do art. 739-A do CPC/73 na execução fiscal). Por fim, a ADI 5.002/MG, da Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais – FEBRAFITE, questionando o Código de Defesa dos Contribuintes do Estado de Minas Gerais. A ministra Cármen Lúcia assume a presidência da Suprema Corte dia 12/9.

ABIA pleiteia suspensão de casos sobre glosa unilateral de ICMS fruto de benefício fiscal

A ABIA – Associação Brasileira de Indústria de Alimentação protocolou, no STF, pedido de suspensão, nos termos do CPC/2015, de todos os casos que tramitem na jurisdição brasileira sobre o seguinte tema com repercussão geral: Glosa unilateral de crédito de ICMS fruto de benefício fiscal supostamente inválido. O tema, tratado no RE 628.075/RS, é da relatoria do ministro Edson Fachin, que ainda não se manifestou quanto à suspensão.

Fecomércio/PR, CNC e Fecomércio/RJ são amigas da Corte

O ministro Dias Toffoli admitiu amici curiae em ADIs diversas. Na ADI 5.469/DF, ajuizada pela Associação Brasileira de Comércio Eletrônico – ABCOMM, admitiu a Fecomércio/PR. A ação ataca as cláusulas 1ª, 2ª, 3ª, 6ª e 9ª do Convênio ICMS 93/2015 do Confaz, que dispõe sobre "os procedimentos a serem observados nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do ICMS, localizado em outra unidade federada". Já na ADI 5.464/DF, ajuizada pelo Conselho Federal da OAB, a Fecomércio/RJ, após ter apresentado procuração com poderes específicos para o ingresso como amicus curiae, teve seu ingresso deferido. Também a CNC foi admitida. A ação tem como objeto a cláusula nona do Convênio Confaz 93/2015, a qual determinou às empresas optantes do Simples Nacional, quando remetentes de bem ou prestadoras de serviço, o recolhimento do diferencial de alíquotas em relação às operações e às prestações que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do ICMS localizado em outra unidade federada, em relação ao imposto devido à unidade federada de destino.

Plenário Virtual Tributário: Reconhecida a repercussão geral de debate sobre Cide Transferência de Tecnologia

Encerrou-se dia 1º/9 a análise, pelo Plenário Virtual, da repercussão geral do tema tratado no RE 928.943/SP (min. Luiz Fux). Com dois votos contrários (ministros Teori Zavascki e Roberto Barroso) e oito favoráveis (ministros Luiz Fux, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Celso de Mello), o Tema 914 foi reputado constitucional e com repercussão geral. Trata da "delimitação do perfil constitucional da contribuição incidente sobre os valores pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos, a cada mês, a residentes ou domiciliados no exterior, a título de remuneração decorrente de contratos que tenham por objeto licenças de uso e transferência de tecnologia, serviços técnicos e de assistência administrativa e semelhantes, bem como royalties de qualquer natureza, instituída pela lei 10.168/2000, e posteriormente alterada pela lei 10.332/2001".

Destaque da semana

Um pedido de vista do ministro Dias Toffoli suspendeu o julgamento do RE 878.694/MG, que discute a legitimidade do tratamento diferenciado dado a cônjuge e a companheiro, pelo artigo 1.790 do Código Civil, para fins de sucessão. O relator, ministro Luís Roberto Barroso, sugeriu a aplicação da seguinte tese: "no sistema constitucional vigente é inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado, em ambos os casos, o regime estabelecido no artigo 1.829 do Código Civil de 2002". Além da inconstitucionalidade do artigo 1.790, o ministro votou pela modulação dos efeitos da decisão para que não alcance sucessões que já tiveram sentenças transitadas em julgado ou partilhas extrajudiciais com escritura pública. Acompanharam-no os ministros Edson Fachin, Teori Zavascki, Rosa Weber, Luiz Fux, Celso de Mello e Cármen Lúcia.

Tá na pauta

Consta como sétimo item da pauta do Pleno do STF dia 8/9 (quinta-feira), o RE 592.891/SP (min. Rosa Weber), que visa saber se há direito ao creditamento do IPI na entrada de insumos provenientes da Zona Franca de Manaus adquiridos sob o regime de isenção. Já há dois votos negando provimento ao recurso da União. O caso volta com o voto-vista do ministro Teori Zavascki.

Global Constitutionalism

A Corte Constitucional da África do Sul comunicou os Poderes Executivo e Legislativo de que eles não podem demorar em seus deveres de emendar legislações reputadas inconstitucionais com o uso, pela Corte, do "apelo ao Legislador", por meio do qual se exorta os Poderes a modificarem a lei ou o ato normativo inconstitucional. A Corte concedeu a terceira extensão de prazo para que o Departamento de Agricultura, Floresta e Pesca, modifique a Lei de Proteção dos Animais (Performing Animals Protection Act). O departamento sofreu tal determinação em razão do julgamento de um caso ajuizado pela Sociedade Nacional para a Prevenção contra Crueldade com os Animais.

Eventos

Estão abertas as inscrições do IX Congresso Internacional de Direito Constitucional do IDP. Dentre os palestrantes, estará o jurista Albie Sachs, juiz da Corte Constitucional da África do Sul indicado por Nelson Mandela. Sachs fará o lançamento da sua obra "Vida e Direito: Uma Estranha Alquimia". O evento se dará nos dias 26, 27 e 28 de outubro.

Obiter Dictum

"Não fui eu!", disse o ministro Teori Zavascki, na inauguração do IDCON, no auditório do UniCeub, em Brasília, após esbarrar a mão no microfone, fazendo um forte estrondo e assustando a plateia.

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Convite

O autor convida os leitores que queiram escrever textos de até quatro páginas analisando casos ou julgamentos do STF. As análises devem ser enviadas por e-mail. (Clique aqui)

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Colunista

Saul Tourinho Leal é doutor em Direito Constitucional pela PUC/SP, tendo ganhado, em 2015, a bolsa de pós-doutorado Vice-Chancellor Fellowship, da Universidade de Pretória, na África do Sul. Foi assessor estrangeiro da Corte Constitucional sul-africana, em 2016, e também da vice-presidência da Suprema Corte de Israel, em 2019. Sua tese de doutorado, "Direito à felicidade", tem sido utilizada pelo STF em casos que reafirmam direitos fundamentais. É advogado em Brasília.