Constituição na Escola

Compliance na Administração Pública: necessidade ou modismo?

Compliance na Administração Pública: necessidade ou modismo?

12/7/2019

Felipe Costa Rodrigues Neves, Tâmara Portela e Jamille Calheiros

A CF/88 no capítulo VII tratou da Administração Pública, isto é, do conjunto de órgãos, serviços e agentes públicos do Estado, que visam, em linhas gerais, satisfazer as necessidades da sociedade, tais como saúde, educação, cultura, segurança, moradia, dentre outros.

O texto constitucional buscou, ao máximo, dar efetividade aos princípios norteadores da atuação do Estado, contudo, como não poderia deixar de ser, no tocante à moralidade dos gastos públicos a Carta Magna não exauriu o tema.

De lá para cá, buscou-se ,através de leis infraconstitucionais, imprimir maior rigor aos gastos governamentais, tendo como exemplo a Lei Federal de Licitações e Contratos (lei 8.666/93).

Por sua vez, o pleito dos gestores e órgãos públicos sempre foi por maior celeridade e desburocratização dos procedimentos exigidos nas contratações com o Poder Público, sob o argumento de que o excesso de exigências legais inviabilizava as políticas públicas em prol da coletividade.

Agora, diante dos recentes casos de corrupção vivenciados no país, o que se vê é uma busca pela transparência e bom uso do dinheiro público, mesmo que, para muitos, isso represente um retrocesso à eficiência pública, tão almejada por todos.

Neste contexto, surge a ideia de incorporar os mandamentos do compliance na Administração Pública, instituto típico das empresas privadas que agora permeia as discussões sobre a malversação dos recursos públicos.

Afinal, o que é compliance?

Este termo apresentado na língua inglesa, que significa "estar em conformidade com", obedecer, satisfazer o que foi imposto, comprometer-se com a integridade, é o assunto da vez das empresas, notadamente aquelas que possuem relação com a Administração Pública.

Programas de integridade começaram a ser adotados pelas empresas, principalmente após terem seus nomes envolvidos em escândalos, como o que ocorreu com a conhecida "operação Lava Jato", que é considerada a maior investigação de corrupção e lavagem de dinheiro já vista no Brasil.

Mas, por que uma empresa, depois de tais acontecimentos, se motivaria a criar um programa de compliance ou integridade?

Para que possa resgatar sua credibilidade perante o mercado, os investidores e principalmente entre seus clientes, já que o sistema tem a finalidade de monitorar e assegurar que todos os envolvidos de uma empresa estejam de acordo com as suas práticas, através de um Código de Conduta.

Na atual conjuntura, é preciso que empresa e colaboradores estejam alinhados com esse Código e convictos da eficácia do programa. Infelizmente, ainda é preciso "ensinar" por meio de um "guia prático" as pessoas a agirem corretamente, conscientizando-as dos prejuízos de práticas ilegais e irregulares no ambiente corporativo e governamental.

Os benefícios são inestimáveis: aumento da eficiência, ganhos de produtividade, importante estratégia de competitividade, preservação da integridade civil e criminal, só para citar alguns.

Apesar da sua comprovada importância e atestada suas vantagens, lamentavelmente, os programas de integridade ainda não são obrigatórios. Mesmo com a publicação da lei 12.846/2013, a conhecida lei anticorrupção, que dispõe sobre a "responsabilização administrativa, e civil das pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira", muitas corporações não adotam um programa desse tipo, correndo riscos de desvirtuamento de seus negócios para fins ilícitos.

Dando início a uma nova ordem na gestão pública, alguns governos têm tomado suas providências no caminho da legalidade. O governo do Distrito Federal, por exemplo, desde o dia 1/6/2019, exige que todas as empresas e instituições que possuem contratos vigentes ou que desejam participar dos procedimentos licitatórios estabeleçam um Programa de Integridade.

Ações como essa tem a função de proteger a Administração Pública dos atos lesivos de seus agentes que resultem em prejuízos ao dinheiro público, causados por irregularidades, falta de ética e de conduta, coibindo em grande medida as fraudes contratuais e garantindo a execução dos contratos conforme a legislação; para que as contratações atinjam sua finalidade precípua, qual seja, promoção de benefícios para a coletividade.

A conclusão que se impõe é de que o programa público de integridade, nascido com o objetivo de contribuir com a sociedade, por meio do fiel cumprimento da legislação, busca, em sua essência, uma melhor distribuição dos recursos públicos, que devem ser destinados a todos os cidadãos.

Espera-se que esta inovação traga bons frutos na esfera governamental, com efetivas vantagens para toda a nação, fazendo com que a prática seja replicada e aprimorada em todos os estados federados do Brasil.

 

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Colunista

Felipe Costa Rodrigues Neves é advogado formado pela PUC-SP, Mestre em Direito pela Stanford University, nos Estados Unidos. Felipe e fundador da ONG "Projeto Constituição na Escola", a maior ONG de educação cívica do Brasil, que promove aulas presenciais sobre Direito Constitucional para milhares de alunos da rede pública todo ano. Felipe já foi eleito como uma das pessoas mais influentes pela Forbes 30 Under 30 (2018), escolhido como um dos 11 jovens lideres brasileiros pela Fundação Obama (2017) e nomeado Young Leader of America, pelo Governo dos Estados Unidos (2016). Felipe ainda é o advogado mais jovem a ter recebido o Prêmio Innovare, do Ministério da Justiça (2017)".