Constituição na Escola

O que diz a Constituição Federal sobre a intervenção do Estado na economia?

O que diz a Constituição Federal sobre a intervenção do Estado na economia?

26/4/2019

Felipe Costa Rodrigues Neves, César Chinaglia Meneses e Maria Paes Barreto de Araujo

Conforme noticiado pela mídia nos últimos dias, o atual presidente da República, ao receber a informação de que o preço do diesel subiria 5,7%, questionou publicamente a política de preços da Petrobras, chegando a entrar em contato com a direção da estatal pedindo esclarecimentos.

Apesar de a discussão parecer ter esfriado, sobretudo diante da posição do ministro da Economia, Paulo Guedes, no sentido de que não haveria intervenção do Estado na política de preços da Petrobras, mostra-se relevante a análise do que diz a Constituição Federal ("CF") a respeito da intervenção do Estado na economia.

Nos termos do art. 170 da CF, a ordem econômica no Brasil deve ser fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, observando a justiça social e os princípios da soberania nacional e da livre concorrência.

Com base nessas premissas, o art. 174 da CF dispõe que o Estado, como agente normativo e regulador, deve exercer, na forma da lei, as funções de (i) fiscalização; (ii) incentivo e (iii) planejamento da atividade econômica.

O art. 173 da CF, por sua vez, permite a exploração direta de atividade econômica pelo Estado, desde que essa atuação seja necessária à segurança nacional ou ao relevante interesse coletivo, nos termos da lei.

Dessa forma, não há dúvidas de que há permissão constitucional para que o Estado atue e intervenha na economia. Contudo, como deve ocorrer essa intervenção?

Em primeiro lugar, importante observar que o já mencionado art. 174 dispõe que a intervenção do Estado deve ocorrer na forma da lei. Esse requisito está em linha com o art. 37 da própria CF, o qual prevê que a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios obedecerá, dentre outros, o princípio da legalidade.

Portanto, o Estado somente pode intervir na economia quando a lei permitir e, por consequência, seus atos devem se limitar ao que dispõe a norma legal.

No que diz respeito à função de fiscalizar, a CF permite ao Estado exercer seu poder de polícia para fins de verificar se determinada atividade está sendo exercida em consonância com a legislação aplicável. Em sendo identificadas irregularidades, pode o Estado aplicar penalidades, desde que estas estejam também previstas em lei.

Essa função é exercida, por exemplo, pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), autarquia federal responsável por assegurar a livre concorrência no mercado, investigar eventual abuso de poder econômico e decidir sobre matéria concorrencial.

Já a função de incentivar do Estado é exercida por meio da concessão de benefícios ligados à economia, tais como: (i) a criação da Zona Franca de Manaus, atualmente prevista no art. 40 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, (ii) o tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte, previsto no já mencionado art. 170 da Constituição, (iii) a possibilidade de parcelamento e pagamento com desconto de dívidas de contribuintes com o Fisco, dentre outros.

Por fim, a função de planejamento é aplicada diretamente nas atividades exercidas pelas pessoas jurídicas de direito público e indiretamente nas atividades exercidas pelas empresas de direito privado. Isso porque, segundo a CF, as atividades exercidas pelo setor público devem considerar o planejamento do Estado como fator determinante. Em contrapartida, quanto ao setor privado, o planejamento do Estado deve ser considerado meramente como fator indicativo.

Desse modo, em linhas gerais, percebe-se que a nossa Constituição, ao dispor sobre a ordem econômica, permite que o Estado atue de forma direta na economia, nos casos em que é necessário salvaguardar a segurança nacional ou há relevante interesse coletivo.

Ademais, há permissão constitucional para que o Estado intervenha como agente normativo e regulador das atividades econômicas exercidas no setor privado, cujas funções são de fiscalizar, incentivar e planejar, esta última ainda que indiretamente.

Essa atuação ou intervenção, contudo, deve observar os ditames da lei e ter como finalidade a Justiça social, a livre concorrência e o desenvolvimento nacional como um todo.

 
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Colunista

Felipe Costa Rodrigues Neves é advogado formado pela PUC-SP, Mestre em Direito pela Stanford University, nos Estados Unidos. Felipe e fundador da ONG "Projeto Constituição na Escola", a maior ONG de educação cívica do Brasil, que promove aulas presenciais sobre Direito Constitucional para milhares de alunos da rede pública todo ano. Felipe já foi eleito como uma das pessoas mais influentes pela Forbes 30 Under 30 (2018), escolhido como um dos 11 jovens lideres brasileiros pela Fundação Obama (2017) e nomeado Young Leader of America, pelo Governo dos Estados Unidos (2016). Felipe ainda é o advogado mais jovem a ter recebido o Prêmio Innovare, do Ministério da Justiça (2017)".