Conexão Suíça

O direito constitucional de não produzir prova contra si: O acesso a celulares e provas em busca e apreensão

O direito constitucional de não produzir prova contra si: O acesso a celulares e provas em busca e apreensão.

20/10/2021

O direito de não produzir provas, comumente traduzido como o direito de um acusado ficar em silêncio durante seu interrogatório policial ou judicial, teve uma interpretação atualizada em território suíço. O Supremo Tribunal Federal do país decidiu em agosto deste ano (caso 1B_277/2021)  que o acusado, quando alvo de medida de busca e apreensão, pode, como reflexo direto de seu direito de não produzir prova contra si, requerer em tempo razoável que as provas apreendidas em seu domicílio sejam lacradas e, por isso, sejam declaradas inacessíveis aos órgãos de investigação. Se realizado o pedido, apenas uma nova decisão judicial específica sobre a questão pode determinar a perda desse direito do investigado.

Na Suíça, a pessoa investigada que é alvo de busca e apreensão possui o direito de, durante a execução da medida, requerer à autoridade executora que determinados objetos sejam lacrados, como celulares, computadores, entre outros. E, ao realizar esse pedido, referidos objetos não podem ser acessados pelos órgãos investigativos – ao menos até que nova decisão judicial seja proferida nesse sentido.

Esse pedido do acusado não é visto como obstáculo às investigações e sim como medida que assegura a legalidade da produção de provas e da cadeia de custódia das provas colhidas.

A jurisprudência estabelece que se o investigado não exercer esse direito imediatamente – durante a apreensão dos objetos e dados – considera-se sua anuência ao acesso do material. No caso tratado pela Corte suíça, o investigado somente formalizou seu pedido de lacre das provas dois dias após a busca, e o tribunal local negou o pedido, alegando que tal manifestação estaria preclusa.

Todavia, a Suprema Corte suíça considerou nova interpretação da norma no sentido de declarar ser legítimo aguardar um prazo razoável a partir da realização da busca e apreensão para que o investigado se manifeste formalmente sobre a questão.

No país, após a coleta de provas em busca e apreensão as autoridades têm o ônus de indicar porque determinado objeto ou prova coletada deve ser "desselada" (= acessada) e possuem o prazo de 20 dias para realizar esse pedido ao judiciário local. Se não o fizerem, perdem o direito de acessar as informações, caso tenha havido pedido do investigado pelo sigilo. Nesse julgamento, o tribunal local decide também pela legalidade da própria medida de busca e apreensão, em um importante e ágil mecanismo de controle dos atos policiais e da produção de provas – que, aliás, lembra a ideia do chamado "juiz de garantias" no Brasil, uma importante inovação legislativa que, infelizmente, ainda se encontra suspensa por decisão do Min. Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal.

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Colunista

Rafael Carlsson Custódio é advogado, especialista em Direito Penal, mestre em Direito e Desenvolvimento (FGV/SP) e mestrando (LLM) em Compliance pela Université de Fribourg, na Suíça. É sócio fundador do escritório Carlsson Custódio Advogados.