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O advogado é indispensável para o inventário extrajudicial? E para o divórcio consensual?

O advogado é indispensável para o inventário extrajudicial ? E para o divórcio consensual ?

17/4/2013

No último domingo, 14/4, Hélio Schwartsman, articulista do jornal Folha de S. Paulo, em texto intitulado "Destruição criadora", afirma ser descabido o protesto de alguns contadores contra o site Contador Amigo, que auxilia os cidadãos na contabilidade de suas firmas. Ele cita Joseph Schumpeter que já vaticinava, em meados do século passado, a destruição de velhas empresas com o surgimento de novas tecnologias.

A opinião do referido jornalista estende-se aos advogados. Segundo ele, "é ridículo obrigar as partes a contratarem advogados para realizar inventários extrajudiciais e divórcios consensuais".

A premissa invocada é verdadeira. As novas tecnologias substituem o trabalho humano em muitas áreas. A indústria é um bom exemplo disso.

Porém, a conclusão é equivocada. Limito-me a dizer sobre os advogados, embora também reconheça igualmente a importância dos contadores, ao menos em face do sistema atualmente vigente.

O arcabouço jurídico apresenta importante complexidade que interfere diretamente nos direitos subjetivos dos cidadãos. Aquilo que aparenta ser simples para uma determinada pessoa, como um inventário extrajudicial, pode não ser. Daí a necessidade de um profissional para orientar, esclarecer e informar aos herdeiros e demais interessados sobre todos os direitos envolvidos e as suas consequências jurídicas.

Há não muito tempo, ao examinar um pedido de inventário extrajudicial, na qualidade de advogado perguntei aos herdeiros, todos filhos do falecido, se algum deles havia se beneficiado em vida por alguma doação ou despesa extraordinária feita pelo pai comum. Eles entreolharam-se e lembraram de uma série de atos de disposição feitos em vida em benefício de um dos herdeiros.

Aquilo que se apresentava aparentemente simples se tornou complicado. As doações feitas pelo pai a um dos filhos, em princípio, devem ser computadas para efeito de divisão de herança. É o que determina o art. 2002, caput, do Código Civil ("Os descendentes que concorrerem à sucessão do ascendente comum são obrigados, para igualar as legítimas, a conferir o valor das doações que dele em vida receberam, sob pena de sonegação"). A esse fenômeno se dá o nome de colação.

O art. 2010 do CC, por sua vez, dispõe que "não virão à colação os gastos ordinários do ascendente com o descendente, enquanto menor, na sua educação, estudos, sustento, vestuário, tratamento nas enfermidades, enxoval, assim como as despesas de casamento, ou as feitas no interesse de sua defesa em processo-crime".

Se as despesas ordinárias não estão sujeitas à colação, a contrário senso, as extraordinárias têm destino oposto. Porém, o que são despesas extraordinárias? A indenização que o pai teve que pagar a terceiro por um dano causado por um de seus filhos menores (art. 932, I, do CC), enquadra-se nessa hipótese? Diversas outras situações poderiam suscitar dúvidas quanto a isso. Quem as responde? Quem deve prestar os devidos esclarecimentos sobre tudo isso? O advogado. Segundo o art. 133 da Constituição Federal, o advogado é indispensável à administração da justiça.

A aplicação do direito não é um processo lógico-formal simples. Ao contrário, é ato complexo. Devem ser levados em consideração, além dos aspectos lógicos, também os axiológicos. Há muitos fatores que podem influenciar no destino patrimonial em caso de morte. A existência de união estável é outro ponto importante. Pode ela decorrer não só da relação entre homem e mulher, mas também de uniões homoafetivas, conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal. Sobre isso, quais são os requisitos para a união estável? A existência de uma união considerada estável entre duas pessoas afasta a existência de outra união simultânea? Quem tem direito em situações assim?

Os herdeiros que não têm contato com o mundo jurídico podem ignorar tudo isso e, muitas vezes, abrem mão de direitos sem saber o que estão fazendo. Por isso a importância de um advogado. De um bom advogado. Não se trata de reserva de mercado.

No divórcio ocorre o mesmo. As consequências jurídicas não são apenas imediatas. Além da divisão de bens, de acordo com o regime de bens adotado para o casamento, há questões relacionadas, por exemplo, ao direito de usar o sobrenome do outro e à pensão alimentícia, que se estendem no tempo.

Além dos aspectos de direito privado, há outros. Qual montante deve ser recolhido a título de imposto? A aplicação da lei pode ser questionada? Em São Paulo, por exemplo, a lei 10.705, de 28 de dezembro de 2000, no art. 12 diz que no cálculo do imposto causa mortis, não serão abatidas quaisquer dívidas que onerem o bem transmitido, nem as do espólio. Ou seja, se o falecido deixa um imóvel ainda não totalmente quitado, terá de recolher o imposto sobre o valor total do bem, independentemente da existência da dívida. É justa tal norma?

No Brasil, se um cidadão compra um imóvel, por exemplo, por R$ 500 mil, e depois o vende por R$ 600 mil, deve pagar "lucro imobiliário" de 15% sobre a diferença entre o valor da venda e o da compra. Se por um lado, pode mesmo haver lucro num caso como esse, há situações, e não são poucas, em que a diferença de preço ocorre simplesmente por causa da desvalorização da moeda (inflação). Quer dizer, vivemos em um país que cobra imposto de renda mesmo não havendo renda. Se isso ocorre com a presença dos advogados, como seria sem eles?

São inúmeras as razões que revelam a imprescindibilidade do advogado, mesmo nos inventários extrajudiciais e divórcios consensuais.

Apesar da qualidade do articulista, sua ideia desconsidera essas e muitas outras peculiaridades que reclamam a presença constante do advogado. A implementação daquilo que é proposto seria o mesmo que pregar a desnecessidade do engenheiro para construir uma ponte ou um prédio. Afinal, um software também poderia dar as respostas sobre a quantidade de ferro e de concreto necessários para uma obra previamente dimensionada pelo interessado.

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Colunista

Adriano Ferriani é professor de Direito Civil da PUC/SP.