Continuo examinando os princípios da lei 8078/90 (Código de Defesa do Consumidor) e os direitos básicos lá estabelecidos.
Vimos algumas garantias estampadas no art. 6º do CDC:
“Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;
II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;
III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;
IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;
V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;
(...)
Com a entrada em vigor do Estatuto da Pessoa com Deficiência (na data de 3 de janeiro de 2016, lei 13.146, de 6-8-2015), o art. 6º do CDC ganhou um parágrafo único, assim disposto:
“Parágrafo único. A informação de que trata o inciso III do caput deste artigo deve ser acessível à pessoa com deficiência, observado o disposto em regulamento.”
Como é possível ver do final da proposição, a regra depende de regulamentação para ter vigência. Ao que consta, o objetivo da norma é obrigar os fornecedores a oferecerem informações cabais também ao consumidor com deficiência. O regulamento terá que lidar com uma enormidade de situações que nem sempre serão de fácil solução, como, por exemplo, a do fornecimento de informações em embalagens de produtos industrializados e que tenham pouco espaço disponível para inserção dos dados. Já existe dificuldade e até descumprimento da norma existente no CDC: em alguns casos, os dados estão impressos em tipos tão miúdos que para lê-los o consumidor tem que usar lupa! Claro que, nesta hipótese, a lei não está sendo respeitada. Quanto ao novo regramento que advirá, uma solução será oferecer a informação em Braile num formulário anexado a algumas embalagens (não haverá necessidade de estar em todas); outra saída será oferecer as informações via web no site do fornecedor por via sonora.
Aliás, oferecer as informações por sistema de som via web é uma alternativa para muitas situações e trará um plus de benefícios a muitos consumidores que, mesmo não se enquadrando na condição do Estatuto, têm alguma dificuldade para obter o dado, como na hipótese do uso da lupa acima citada.
O Estatuto postergou, portanto, a entrada em vigor dessa norma que cuida das informações sobre produtos e serviços no que respeita ao consumidor com deficiência. Entretanto, seu artigo 69 também cuidou desse aspecto, o que pode gerar alguma dúvida sobre a vigência da determinação. Leiamos, inicialmente, o que ficou estabelecido:
“Art. 69. O poder público deve assegurar a disponibilidade de informações corretas e claras sobre os diferentes produtos e serviços ofertados, por quaisquer meios de comunicação empregados, inclusive em ambiente virtual, contendo a especificação correta de quantidade, qualidade, características, composição e preço, bem como sobre os eventuais riscos à saúde e à segurança do consumidor com deficiência, em caso de sua utilização, aplicando-se, no que couber, os arts. 30 a 41 da Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990.
§ 1º Os canais de comercialização virtual e os anúncios publicitários veiculados na imprensa escrita, na internet, no rádio, na televisão e nos demais veículos de comunicação abertos ou por assinatura devem disponibilizar, conforme a compatibilidade do meio, os recursos de acessibilidade de que trata o art. 67 desta Lei, a expensas do fornecedor do produto ou do serviço, sem prejuízo da observância do disposto nos arts. 36 a 38 da Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990.
§ 2º Os fornecedores devem disponibilizar, mediante solicitação, exemplares de bulas, prospectos, textos ou qualquer outro tipo de material de divulgação em formato acessível.”
É preciso, pois, fazer uma interpretação sistemática desse dispositivo na sua conexão com o CDC. Tendo em vista que a própria lei 13.146 complementou a lei consumerista para incluir uma norma específica no art. 6º, cuidando das informações a serem oferecidas ao consumidor com deficiência e dizendo que ela depende de regulamentação, penso que somente após o surgimento efetivo da regulamentação desse dispositivo poder-se-á dizer que os fornecedores estão sujeitos às designações previstas no art. 69 referido. Caso contrário, ficaria sem sentido a inclusão do parágrafo único do art. 6º do CDC.
Ademais, é razoável que esse tipo de dispositivo deva ser regulamentado, o que permitirá melhor compreensão por aqueles que devem cumprir as determinações. Além disso, e acima de tudo, anoto que a norma do art. 69 é dirigida ao Poder Público, enquanto a do parágrafo único do art. 6º do CDC é imposta aos fornecedores. Logo, conclui-se que, após a regulamentação, os fornecedores estarão obrigados a cumprir as determinações, cabendo ao Poder Público, por sua vez, a incumbência de exercer eficaz fiscalização a respeito.
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Continua na próxima semana
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