Como hoje é 31 de outubro, dia de Halloween, eu interrompo a análise dos princípios da lei 8078/90 (CDC) e os direitos básicos lá estabelecidos, para cuidar dessa festa na relação com os consumidores, especialmente crianças e adolescentes.
Pois bem. É lugar comum perguntar: o que é bom para os norte-americanos é bom para o resto do mundo? É bom para os brasileiros?
Todos sabem que os norte-americanos adoram impor seus produtos e serviços para os consumidores dos demais países e fazem isso muito bem, utilizando-se de várias técnicas, dentre as quais a da apresentação e entrega de seus projetos e modelos culturais, seus filmes, suas músicas, seus enlatados de tevê, sua língua.... Ok! (Ops...). Mas, no caso do Halloween, sou obrigado a reconhecer que eles não têm essa responsabilidade (ao menos diretamente).
Fomos nós, brasileiros e brasileiras, que, de livre e espontânea vontade, importamos a “festividade macabra”. Como já lembrei aqui neste espaço, no meu tempo de criança ou adolescente (há cerca de cinquenta e cinco anos), seria impensável um dia das bruxas no Brasil.
Não sei quando começou. Mas, possivelmente, há cerca de vinte anos, mais ou menos, alguma escola de inglês deve ter feito a programação para seguir o ritual dos EUA. Depois, no ano seguinte mais uma escola e mais outra etc. Com a importação via tevê a cabo e também tevê aberta de, cada vez mais, filmes e mesmo programas jornalísticos que reproduzem a festa, aos poucos, as pessoas por aqui foram se acostumando, como se a festividade também fizesse parte de nossa realidade. Daí, o “dia das bruxas” chegou às escolas de ensino fundamental; depois em baladas de adultos e, enfim, na atualidade, parece que ela tem a ver conosco.
Nas tevês a cabo, na internet, nos canais de programas infantis, são apresentados programas específicos somente sobre a festa. Evidentemente, o mercado, sempre de olho nas oportunidades, deu sua contribuição e eis que temos entre nós crescendo vigorosamente uma festa importada, sem qualquer fundamento cultural e mesmo sem sentido ritualístico.
E as “bruxas e bruxos” do marketing, que sempre aproveitam alguma coisa para faturar e, no caso, uma boa receita, vendem bugigangas, doces e mais porcarias para nossas crianças. Essa forma de domínio capitalista, no final do século XX e início do XXI, passou a se imiscuir em praticamente todas as atividades humanas, transformando em evento comercial qualquer comemoração, no que, claro, contam com a ativa participação dos consumidores e consumidoras.
É verdade que algumas escolas, não conseguindo fugir do evento, começaram a fazer atividades didáticas e lúdicas, sem o emporcalhamento de doces e guloseimas oferecidos em grandes quantidades e sem nenhuma função de educação ou saúde. Mas, é pouco, pois, infelizmente, tudo indica que o tal dia das bruxas, famoso nos EUA, instalou-se entre nós, de forma alegremente macabra (...).
Lembro do texto recebido por meu amigo Outrem Ego, da administração do condomínio onde ele tem uma casa de campo. Era um convite intitulado “Gostosuras ou travessuras” para as crianças darem um passeio com paradas nas casas dos condôminos e lá pedirem doces. E estava escrito que no final do passeio haveria “a baladinha e o labirinto do terror”.
Eu, naquela oportunidade, insisti com ele que nossas comemorações de Páscoa e Natal, por exemplo, também são importadas. Ele concordou, mas esperava que nos dias atuais fosse mais difícil que se implantasse entre nós algo sem ligação cultural ou base social apenas e tão somente visando às vendas de produtos. “No caso, venda de doces e porcarias”.
Bem, no caso das comidas, até o Natal mereceu uma adaptação. Por muitos anos – e ainda até hoje – nas comemorações natalícias, em pleno verão tropical e escaldante, são ingeridas comidas gordurosas, doces etc., alimentos típicos de lugares frios, de onde a festa foi importada. E o coitado do Papai Noel é obrigado a trajar aquela roupa quente no calor de mais de 30 graus. O consolo é que, pelo menos, o Natal traz algum alento, especialmente para os que se lembram que nesta data é celebrado o nascimento de Jesus Cristo.
Realmente, a conscientização a respeito do controle exercido pelo mercado ainda é pequena. O consumidor e a consumidora, considerados como tal, aos poucos, passaram a reclamar e a reivindicar direitos. Mas, ainda não consegue compreender exatamente por que participa de certos eventos ou gasta seu dinheiro adquirindo produtos e serviços. Essa questão do Halloween no Brasil oferece uma boa oportunidade para o exame de como as coisas são feitas.
Se ainda existisse algum significado simbólico ou ritualístico na festa, vá lá. Mas nem as crianças-vítimas ou seus pais e mães sabem do que se trata. É apenas um momento de gasto inútil de dinheiro em fantasias, doces e gorduras.
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