ABC do CDC

A relação jurídica de consumo - O conceito de serviço - Parte IV

A relação entre o princípio da eficiência no CDC e a qualidade dos serviços públicos, enfatizando a importância de serem adequados, seguros e contínuos.

26/9/2024

Continuo examinando a relação jurídica de consumo estabelecida no CDC - Código de Defesa do Consumidor, ainda no exame do conceito de serviço.

Na semana passada, terminamos lembrando que no art. 22, o CDC estabelece a obrigatoriedade de que os serviços prestados sejam “adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos”. Continuemos o exame da norma.

Em primeiro lugar diga-se que essa disposição da norma decorre do princípio constitucional estampado no caput do art. 37. É o chamado princípio da eficiência, que comentamos no início do presente livro.

É verdade que tal princípio somente passou a integrar explicitamente o corpo constitucional com a edição da Emenda 19, de 4 de junho de 1998, data posterior à edição da lei 8.078/90. Mas a emenda citada apenas tornou explícito o princípio outrora implícito em nosso sistema constitucional, como explicam os Professores Luiz Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Júnior:

“O princípio da eficiência tem partes com as normas de ‘boa administração’, indicando que a Administração Pública, em todos os seus setores, deve concretizar atividade administrativa predisposta à extração do maior número possível de efeitos positivos ao administrado. Deve sopesar relação de custo-benefício, buscar a otimização de recursos, em suma, tem por obrigação dotar da maior eficácia possível todas as ações do estado”1.

Hely Lopes Meirelles disciplina que a eficiência é um dever imposto a todo e qualquer agente público no sentido de que ele realize suas atribuições com presteza, perfeição e rendimento funcional. Diz o administrativista:

“É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros”2.

É fato que a lei designa outros adjetivos aos serviços prestados, além do relativo à eficiência: fala em adequado, seguro e contínuo (este último para os essenciais, tipo de serviço que ainda comentaremos).

Ora, adjetivos expõem a qualidade de alguma coisa, no caso o serviço público. Então, quando o princípio constitucional do art. 37 impõe que a Administração Pública forneça serviços eficientes, está especificando sua qualidade. Ou, em outros termos, o tão falado conceito de qualidade, do ponto de vista dos serviços públicos, está marcado pelo parâmetro constitucional da eficiência.

E essa eficiência tem ontologicamente a função de determinar que os serviços públicos ofereçam o “maior número possível de efeitos positivos” para o administrado.

Isso significa que não basta haver adequação, nem estar à disposição das pessoas. O serviço tem de ser realmente eficiente; tem de cumprir sua finalidade na realidade concreta. O significado de eficiência remete ao resultado: é eficiente aquilo que funciona.

A eficiência é um plus necessário da adequação. O indivíduo recebe serviço público eficiente quando a necessidade para a qual ele foi criado é suprida concretamente. É isso que o princípio constitucional pretende.

Assim, pode-se concluir com uma classificação das qualidades dos serviços públicos, nos quais o gênero é a eficiência, tudo o mais decorrendo dessa característica principal. Logo, adequação, segurança e continuidade (no caso dos serviços essenciais) são características ligadas à necessária eficiência que devem ter os serviços públicos.

Realmente, o serviço público só é eficiente se for adequado (p. ex., coleta de lixo seletiva, quando o consumidor tem como separar por pacotes o tipo de material a ser jogado fora), se for seguro (p. ex., transporte de passageiros em veículos controlados, inspecionados, com todos os itens mecânicos, elétricos etc. checados: freios, válvulas, combustível etc.), e, ainda, se for contínuo (p. ex., a energia elétrica sem cessação de fornecimento, água e esgoto da mesma forma, gás etc.3).

Para uma classificação dos serviços públicos pelo aspecto da qualidade regulados pelo CDC, ter-se-ia, então, de dizer que no gênero eficiência estão os tipos adequado, seguro e contínuo.

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Continua na próxima semana.

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1 Curso de direito constitucional, São Paulo: Saraiva, 1998, p. 235.

2 Direito administrativo brasileiro, São Paulo: Malheiros, 2012, p. 90.

3 Na sequência trataremos do aspecto da continuidade do serviço essencial.

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Colunista

Rizzatto Nunes é desembargador aposentado do TJ/SP, escritor e professor de Direito do Consumidor. Para acompanhar seu conteúdo nas redes sociais: Instagram: @rizzattonunes, YouTube: @RizzattoNunes-2024, e TikTok: @rizzattonunes4.