Continuo a análise dos direitos básicos dos consumidores. Hoje mostrando o caráter principiológico do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Antes de examinar as normas estabelecidas na lei 8.078/90 (CDC) é necessário avaliar uma questão preliminar, que deve nortear o trabalho de todos aqueles que pretendem compreendê-las.
Chamo a atenção para um fato conhecido: o CDC tem vida própria; foi criado como subsistema autônomo e vigente dentro do sistema constitucional brasileiro.
Além disso, os vários princípios constitucionais que o embasam são elementos vitais ao entendimento de seus ditames.
Não é possível interpretar adequadamente a legislação consumerista se não se tiver em mente esse fato de que ela comporta um subsistema no ordenamento jurídico, que prevalece sobre os demais — exceto, claro, o próprio sistema da Constituição, como de resto qualquer norma jurídica de hierarquia inferior —, sendo aplicável às outras normas de forma supletiva e complementar1.
Além disso, a edição do Código de Defesa do Consumidor inaugurou um novo modelo jurídico dentro do Sistema Constitucional Brasileiro.
Em primeiro lugar, a lei 8.078/90 é Código por determinação constitucional (conforme art. 48 do ADCT/CF), o que mostra, desde logo, o elemento de ligação entre ele e a Carta Magna.
O CDC é uma lei principiológica, modelo até então inexistente no Sistema Jurídico Nacional.
Como lei principiológica entende-se aquela que ingressa no sistema jurídico, fazendo, digamos assim, um corte horizontal, indo, no caso do CDC, atingir toda e qualquer relação jurídica que possa ser caracterizada como de consumo e que esteja também regrada por outra norma jurídica infraconstitucional.
Assim, por exemplo, um contrato de seguro de automóvel continua regulado pelo Código Civil e pelas demais normas editadas pelos órgãos governamentais que regulamentem o setor (Susep, Instituto de Resseguros etc.), porém estão tangenciados por todos os princípios e regras da lei 8.078/90, de tal modo que, naquilo que com eles colidirem, perdem eficácia por tornarem-se nulos de pleno direito.
E mais e principalmente: o caráter principiológico específico do CDC é apenas e tão somente um momento de concretização dos princípios e garantias constitucionais vigentes desde 5 de outubro de 1988 como cláusulas pétreas, não podendo, pois, ser alterados.
Com efeito, o que a lei consumerista faz é tornar explícitos, para as relações de consumo, os comandos constitucionais. Dentre estes destacam-se os Princípios Fundamentais da República, que norteiam todo o regime constitucional e os direitos e garantias fundamentais.
Assim, à frente de todos está o superprincípio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), como especial luz a imantar todos os demais princípios e normas constitucionais e apresentando-se a estes como limite intransponível e, claro, a toda e qualquer norma de hierarquia inferior.
A seguir, no texto constitucional estão os demais princípios e garantias fundamentais que são reconhecidos no CDC e que aqui relembramos: o princípio da igualdade (CF, art. 5º, caput e inciso I); a garantia da imagem, da honra, da privacidade, da intimidade, da propriedade e da indenização por violação a tais direitos de modo material e também por dano moral (CF, art. 5º, V, c/c, os incisos X e XXII); ligado à dignidade e demais garantias está o piso vital mínimo insculpido como o direito à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à segurança, à previdência social, à maternidade etc. (CF, art. 6º); e unidos a todos esses direitos está o da prestação de serviços públicos essenciais com eficiência, publicidade, impessoalidade e moralidade (CF, art. 37, caput).
Não se pode olvidar que é também cláusula pétrea, como dever absoluto para o Estado, a defesa do consumidor (CF, art. 5º, XXXII).
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Continua na próxima semana.
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1 A designação do alcance específico da lei 8.078/90 se dá pela explicitação do sentido de relação de consumo, fixada no estabelecimento da definição do conceito de consumidor, de fornecedor, de produto e de serviço.