ABC do CDC

A indenização por dano moral nos atrasos das viagens de avião

Hipóteses de cabimento do pedido de indenização por dano moral, em função do atraso de voos.

17/8/2023

Com o término efetivo da pandemia da COVID, houve um forte retorno das viagens aéreas nacionais e internacionais e, naturalmente, alguns problemas acabam se repetindo. Por exemplo, o do atraso de voos.

Volto, pois, ao tema, lembrando que esse setor do transporte aéreo de passageiros é um daqueles em que o consumidor está numa situação de extrema vulnerabilidade: ele fica literalmente nas mãos do transportador que decide como será sua viagem, se adequada ou inadequada, livre de problemas ou cheia de transtornos. Qualquer pessoa que viaje entende muito bem do que eu falo: nunca se sabe se dará tudo certo. Quer seja uma viagem de negócios ou de lazer, sempre se está numa expectativa incerta. Atrasos e falta de informações são muito comuns. Ao consumidor e à consumidora só resta torcer para que tudo dê certo. 

Cuido dos atrasos. Há, é verdade, atrasos honestos, tais como aqueles que envolvem eventos climáticos, acidentes ou problemas mecânicos com aeronaves ou, ainda, eventuais entraves com o tráfego aéreo envolvendo outras aeronaves. Mas não esqueçamos de que podem acontecer os atrasos programados: os que envolvem voos em que as aeronaves estão com pouca ocupação. Nesta hipótese,  um voo é cancelado para que um outro, posterior, saia lotado e para o qual os passageiros foram realocados. É verdade, que no atual período em que há grande procura pelos voos, essa prática deixa de existir.

De todo modo, na questão do atraso, anoto que, independentemente do motivo, sempre que ele for superior a 4 horas, o consumidor pode pleitear indenização por danos morais.

A assunto do atraso dos voos está regulamentado pela resolução nº 400 de 13-1-2016 da ANAC, que garante assistência material ao passageiro ou passageira do seguinte modo:

"Art. 27. A assistência material consiste em satisfazer as necessidades do passageiro e deverá ser oferecida gratuitamente pelo transportador, conforme o tempo de espera, ainda que os passageiros estejam a bordo da aeronave com portas abertas, nos seguintes termos:

I - superior a 1 (uma) hora: facilidades de comunicação;

II - superior a 2 (duas) horas: alimentação, de acordo com o horário, por meio do fornecimento de refeição ou de voucher individual; e

III - superior a 4 (quatro) horas: serviço de hospedagem, em caso de pernoite, e traslado de ida e volta.

§ 1º O transportador poderá deixar de oferecer serviço de hospedagem para o passageiro que residir na localidade do aeroporto de origem, garantido o traslado de ida e volta.

§ 2º No caso de Passageiro com Necessidade de Assistência Especial - PNAE e de seus acompanhantes, nos termos da resolução nº 280, de 2013, a assistência prevista no inciso III do caput deste artigo deverá ser fornecida independentemente da exigência de pernoite, salvo se puder ser substituída por acomodação em local que atenda suas necessidades e com concordância do passageiro ou acompanhante.

§ 3º O transportador poderá deixar de oferecer assistência material quando o passageiro optar pela reacomodação em voo próprio do transportador a ser realizado em data e horário de conveniência do passageiro ou pelo reembolso integral da passagem aérea."

Em relação ao dano moral, o que interessa são os atrasos superiores a 4 horas. Neste caso, é possível pleitear indenização. Importante consignar que, nas decisões judiciais, o atraso em período menor do que 4 horas é considerado mero aborrecimento. Logo não cabe o pleito. Mas acima das 4 horas o pedido é viável.

Lembro, também, que a responsabilidade das companhias aéreas é objetiva, como decorrência da incidência do Código de Defesa do Consumidor, especificamente o artigo 14 da lei. Alegações de que o atraso superior a 4 horas deu-se por problemas climáticos ou por ausência de piloto,  do copiloto ou de membros da equipe de bordo, ou, ainda, problemas mecânicos ou de segurança  da aeronave etc. não excluem a responsabilidade, pois são hipóteses de fortuito interno (previsíveis dentro da análise do risco da atividade). As exceções são as relacionadas aos fortuitos externos (e não previsíveis), tais como um terremoto ou a eclosão de um vulcão.

Desse modo, na medida em que o atraso se dê por período superior a 4 horas, existe nexo de causalidade,  que pode gerar, então, a condenação ao pagamento de indenização por danos morais. Não existe, claro,  um valor definido,  mas a pesquisa jurisprudencial mostra que as indenizações variam, dependendo daquilo que o consumidor demonstrar em juízo e que envolve o dano efetivamente sofrido, o real tempo de atraso de espera após as 4 horas e as condições de atendimento oferecido pela cia aérea (as informações, a alimentação, a hospedagem, o transporte etc.).

Por fim, anoto que é relevante, para o aumento do valor da indenização, e tem sido levado em conta nas decisões judiciais, a demonstração da perda de compromissos  profissionais ou familiares.

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Colunista

Rizzatto Nunes é desembargador aposentado do TJ/SP, escritor e professor de Direito do Consumidor. Para acompanhar seu conteúdo nas redes sociais: Instagram: @rizzattonunes, YouTube: @RizzattoNunes-2024, e TikTok: @rizzattonunes4.