ABC do CDC

O direito de reclamar por vícios e a suspensão do prazo decadencial

Colunista cuida do direito do consumidor reclamar por vícios dos produtos e dos serviços e da suspensão do prazo decadencial.

18/5/2023

Como se sabe, no direito do consumidor, é decadencial o prazo para a apresentação de reclamação por vícios, conforme disciplinado no art. 26 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), verbis:

"Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em:

I - trinta dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos não duráveis;

II - noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis.

§ 1° Inicia-se a contagem do prazo decadencial a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços.

§ 2° Obstam a decadência:

I - a reclamação comprovadamente formulada pelo consumidor perante o fornecedor de produtos e serviços até a resposta negativa correspondente, que deve ser transmitida de forma inequívoca;

II - (Vetado).

III - a instauração de inquérito civil, até seu encerramento.

§ 3° Tratando-se de vício oculto, o prazo decadencial inicia-se no momento em que ficar evidenciado o defeito".           

À primeira vista, a leitura do inciso I do § 2º do art. 26 traz fácil entendimento, uma vez que, realmente, a interpretação gramatical aponta um dos sentidos do texto: obsta a decadência a reclamação feita pelo consumidor ao fornecedor.

Todavia, é de se perguntar:

a) A reclamação pode ser verbal?

b) Tem que ser feita pessoalmente ou pode ser pelo telefone e pela internet?

c) Tem que ser feita pelo próprio consumidor ou por alguma entidade de defesa do consumidor em seu nome?

d) A que pessoa real no fornecedor a reclamação tem que chegar?

É evidente que uma norma protecionista que tenha conferido prazos curtos (30 e 90 dias) para o consumidor agir e não decair de seu direito tenha que ser interpretada da maneira mais ampla e abrangente possível em relação à forma de constituição dessa garantia. Além do fato de que a regra básica é de proteção ao consumidor (art. 1º), reconhecido como vulnerável (inciso I do art. 4º), cuja interpretação necessariamente deve buscar igualdade real (art. 5º, caput e inciso I, da CF), para gerar equilíbrio no caso concreto (art. 4º, III) etc. Essas características devem ser levadas em conta para o sentido de tudo o que está estabelecido no § 2º.

Assim, a lei exige que o consumidor comprove que fez a reclamação, mas nada impede que esta seja verbal, pessoalmente, por telefone ou via internet. A prova dessa reclamação, se necessária, será feita no processo judicial, por todos os meios admitidos. É claro que, para o consumidor se garantir plenamente e não correr o risco de perder seu direito, o ideal será que faça a reclamação por escrito e a entregue ao fornecedor: por intermédio de Cartório de Títulos e Documentos; mediante o serviço de correios com aviso de recebimento; ou protocolando cópia diretamente no estabelecimento do fornecedor etc.

Acontece que não se deve olvidar da realidade do mercado e da dinâmica do atendimento existente. São centenas de empresas que têm colocado à disposição do cliente os Serviços de Atendimento ao Consumidor, conhecidos como SACs, exatamente para receber, via telefone ou pela internet, as reclamações relativas a vícios dos produtos e dos serviços.

Supor que o consumidor, em vez de se servir desse atendimento oferecido, vá burocratizar a relação, preparando um documento escrito e remetendo-o pelo Cartório, é ir contra o andamento natural das relações de consumo. Além do que, quando há SAC oferecido pelo fornecedor e posto à disposição do consumidor, esse serviço integra a oferta e assim vincula o ofertante (arts. 30 e segs. do CDC).

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Rizzatto Nunes é desembargador aposentado do TJ/SP, escritor e professor de Direito do Consumidor. Para acompanhar seu conteúdo nas redes sociais: Instagram: @rizzattonunes, YouTube: @RizzattoNunes-2024, e TikTok: @rizzattonunes4.