ABC do CDC

A questão dos vícios nos produtos usados

Hoje, em continuidade, trato dos vícios nesses produtos e como o consumidor pode exercer os direitos fixados na lei.

8/9/2022

Na semana passada, cuidei dos aspectos da garantia legal que envolve os produtos usados, prevista no Código de Defesa do Consumidor (CDC). Hoje, em continuidade, trato dos vícios nesses produtos e como o consumidor pode exercer os direitos fixados na lei.

Com efeito, o exercício desses direitos está previsto nas hipóteses do artigo 18 do CDC, que  envolvem os vícios de qualidade ou quantidade que tornem os produtos usados impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor.

Dispõe o "caput" do artigo 18 “caput” do CDC e, também, o § 1º, o seguinte:

"Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

§ 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;

II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;

III - o abatimento proporcional do preço."

Muito bem. Essa regra do citado §1º do artigo 18 vale para todos os tipos de produtos, inclusive, os usados. Logo, o fornecedor tem a obrigação de sanar o vício no prazo máximo de 30 dias. Caso ele não consiga sanar o vício nesse tempo, então, o consumidor tem a seu dispor as hipóteses dos incisos I, II e III. E, como diz a norma, por escolha sua.

Todavia, surgem algumas dúvidas em relação à hipótese do inciso I no caso do produto ser usado. Como o consumidor poderia exigir a substituição do produto usado por outro da mesma espécie em perfeitas condições de uso?

Um bom exemplo para estudarmos a questão é a do veículo usado (que envolvem milhares de transações todos os meses). Para que o consumidor pudesse exigir a troca teria que apontar um veículo que fosse igual ao adquirido, o que seria muito difícil, pois como se sabe, as características de  cada um deles varia muito: ano, cor, tempo de uso, quilometragem, gastos de pneus, amortecedores, molas etc.

Assim, penso que a previsão do inciso I seja, de fato, na realidade das transações, esvaziada, com muita dificuldade de ser exercida.

As duas outras hipóteses (dos incisos II e III), no entanto, são plenamente aplicáveis ao caso de vício encontrado no produto usado.

De todo modo, ainda que não seja possível a utilização da regra do inciso I do §1º do art.18 pelo comprador do produto usado de forma direta, existe uma outra alternativa prevista no §4º do mesmo artigo que afeta o previsto naquele §1º . Vejamos:

"§ 4° Tendo o consumidor optado pela alternativa do inciso I do § 1° deste artigo, e não sendo possível a substituição do bem, poderá haver substituição por outro de espécie, marca ou modelo diversos, mediante complementação ou restituição de eventual diferença de preço, sem prejuízo do disposto nos incisos II e III do § 1° deste artigo."

Primeiramente, anoto que essa escolha prevista no §4º é opcional do consumidor, que não precisa justificá-la. Trata-se de mero expressar objetivo de sua vontade. Assim, ele poderá aceitar em troca:

a) outro produto de espécie, marca ou modelo diferentes, que tenha preço mais barato do que foi pago pelo produto viciado;

b) outro produto de espécie, marca ou modelo diferentes, que tenha preço superior àquele que foi pago pelo produto viciado.

No primeiro caso, o consumidor terá direito a receber a diferença do preço a seu favor, no ato da troca. No segundo, terá que pagar o complemento da diferença do preço pago a menor.

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Colunista

Rizzatto Nunes é desembargador aposentado do TJ/SP, escritor e professor de Direito do Consumidor.