O Código de Defesa do Consumidor (CDC) diz que "a publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal". (art. 36, "caput").
Esse texto da lei repete em parte as normas do Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária, que dizem que a atividade publicitária tem que ser sempre ostensiva (art. 9º, "caput") e que o anúncio deve ser claramente distinguido como tal, seja qual for a sua forma ou meio de veiculação (art. 28). Como se vê, o CDC determina que, além de ostensivo, o anúncio publicitário deve ser claro e passível de identificação imediata pelo consumidor. É a proibição da chamada publicidade clandestina.
Trata-se da conhecida técnica do "merchandising", utilizada para veicular produtos e serviços de forma indireta por meio de inserções em programas e filmes. Dessa maneira, muitos produtos são veiculados sem que os consumidores se deem conta de que o que eles estão assistindo significa uma prática publicitária, mesmo nos casos mais evidentes. De fato, quando uma personagem importante na novela das oito entra num bar e pede uma Coca-Cola, o telespectador-consumidor não sabe se aquela demonstração específica é ou não publicidade do produto veiculado. Nem tudo é, mas muitas são.
Existem várias maneiras de produzir o chamado merchandising. Haverá aquele que, apesar de se caracterizar por inserção indireta, não se reveste de clandestinidade. É que, em alguns casos, fica claro para o consumidor – ou telespectador – que se trata de publicidade. Cite-se como exemplo o caso do apresentador que, durante o transcurso do programa de auditório, oferece produtos e até os elogia.
O problema está no merchandising típico da clandestinidade, uma vez que a finalidade dessa técnica é exatamente não aparecer como publicidade. Aliás, quando a lei surgiu, em 1990, alguns publicitários, em polvorosa, reclamaram (não só por causa dessa regra, mas também pelas outras que proíbem a publicidade enganosa e abusiva), dizendo que o CDC impediria grande parte do trabalho deles. No caso, seria o fim do merchandising. Isso porque o melhor merchandising é exatamente aquele em que a publicidade não é identificada como tal. Mas, veja, caro leitor, o CDC nada fez de novo, pois a própria norma autoregulamentadora do setor, que é de 1980, também proíbe a prática.
Mas, eis que vivemos em tempos de redes sociais e agora novos modelos de publicidade, via esquemas de marketing, surgem aberta ou clandestinamente. Sei que nas redes sociais, o consumidor pode ter alguma voz, mas elas também servem para a promoção de produtos e serviços nem sempre claramente apresentados. Isso atinge adultos e crianças. Vejamos um exemplo no que diz respeito às crianças.
Em matéria recente, publicada no site da revista Veja, Renato Godoy, assessor de Relações Governamentais do Programa Criança e Consumo, do Alana, relatou a estratégia utilizada pelos fabricantes da boneca LOL1. Trata-se de uma complexa estratégia de divulgação que se serve da influência de youtubers mirins e seus populares vídeos de unboxing – termo que denomina o ato de desembrulhar o produto e que já integra o vocabulário de famílias com crianças pequenas.
Essa boneca, minúscula (tem apenas 8 centímetros), é entregue envolta por sete camadas de plástico, que escondem itens de vestuário e a própria identidade da personagem, que só é revelada após todo o processo de unboxing. Como diz Renato Godoy, a "característica central do brinquedo, então, já se confunde com a sua própria estratégia de divulgação. Tal como nos vídeos de youtubers mirins, o principal atrativo da boneca é o ato de desembrulhar a embalagem e encontrar as novidades, que surgem a cada camada de plástico descartada. O produto é a mensagem. E vice-versa".
Os vários modelos da LOL servem para estimular o colecionismo, sentimento que atinge adultos e crianças, cuja função é vender cada vez mais o mesmo produto. A boneca Barbie está aí há muitos anos como prova do sucesso desse tipo de negócio.
A matéria mostra que o preço do brinquedo varia entre 60 e 200 reais e, a demanda era e é tanta que, às vésperas do Natal, consumidores e comerciantes se queixaram da falta do produto.
A criatividade humana é, realmente, brilhante. Para o bem ou para o mal. Em termos de mercado de consumo e de publicidade, as redes sociais vieram para permitir um enorme aumento de penetração na comunicação de fornecedores com consumidores - mirins ou adultos. E, de fato, nesse mundo complexo da web é muito difícil distinguir o que é e o que não é publicidade.
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