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As poison pills americanas e as supostas poison pills brasileiras

Érica Gorga

As ditas "poison pills" brasileiras são diferentes do que se convencionou chamar de poison pill nos Estados Unidos. As americanas são usualmente chamadas de "shareholder rights plans", ou seja, planos que atribuem aos acionistas direitos de aquisição de ações da companhia por preço significativamente inferior ao de mercado.

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Atualizado às 07:43


As poison pills americanas e as supostas poison pills brasileiras

Érica Gorga*

As ditas "poison pills" brasileiras são diferentes do que se convencionou chamar de poison pill nos Estados Unidos. As americanas são usualmente chamadas de "shareholder rights plans", ou seja, planos que atribuem aos acionistas direitos de aquisição de ações da companhia por preço significativamente inferior ao de mercado. Tais direitos poderão ser exercidos somente se alguém adquirir determinado montante do capital da companhia (digamos 10% ou 15%). Como o adquirente é automaticamente excluído do plano de direitos de acionistas, o efeito é que suas ações serão diluídas significativamente, impedindo-se, então, a tomada de controle. Assim, pode-se dizer que as poison pills americanas permitem a emissão de ações não com a finalidade pura e simples de aumentar o capital da companhia para suprir necessidades de financiamento, mas com o objetivo de barrar tomadas de controle hostis. Elas, portanto, desencorajam a compra de grandes blocos de ações sem autorização prévia do conselho de administração da companhia-alvo, já que somente o conselho poderá suspender o seu funcionamento.

As erroneamente chamadas "poison pills brasileiras", na verdade, são conhecidas como mandatory tender offers lá fora, também funcionando como defesas contra aquisição hostil de controle. Analisamos recentemente os estatutos de 84 companhias do Nível 1, do Nível 2 e do Novo Mercado que não possuíam acionistas com mais de 50% das ações ordinárias. Isso porque somente faz sentido a adoção de defesas contra tomadas de controle hostis por companhias que não possuam controladores, já que estes podem barrar aquisições de controle por sua mera vontade, votando a maioria das ações na AG. O estudo revelou que 56% das companhias da amostra incluem defesas contra tomadas de controle nos seus estatutos. Dois tipos de defesas foram identificadas. A tipo A estabelece que, uma vez que determinado montante de ações é adquirido, o adquirente será obrigado a realizar uma oferta pública para aquisição da totalidade de ações da companhia. O gatilho de disparo de tal obrigação varia entre 10% a 35% das ações. A tipo B estabelece que alguém que queira adquirir mais ações da companhia, além de um determinado gatilho (que varia de 5% a 30% das ações) deverá comunicar sua intenção ao Diretor de Relações com Investidores e ao Diretor de Pregão da bolsa para que um leilão de compra seja organizado, sendo vedadas aquisições privadas ou em mercado de balcão. O estudo mostra que aproximadamente 37% das companhias adotam exclusivamente a defesa tipo A e 14% adotam o tipo A juntamente com o tipo B. Só quatro companhias adotam exclusivamente o tipo B. A maioria das companhias que adota a defesa tipo A usa o gatilho de 20% e a maioria que adota o tipo B usa o gatilho de 10%.

O estudo mostra que 100% das companhias que adotam poison pills brasileiras também adotam cláusulas de penalidades. Foram encontrados dois tipos de penalidades. A penalidade tipo 1 é aplicada ao adquirente que descumpriu a obrigação imposta pela poison pill. O conselho convocará uma assembléia de acionistas na qual será deliberada a suspensão de direitos do acionista adquirente, sem que ele possa nela votar. O adquirente poderá ser responsabilizado e obrigado a indenizar os outros acionistas. A penalidade tipo 2 é imposta a todos os acionistas que tentarem restringir o efeito ou remover a cláusula poison pill do estatuto da companhia. Os acionistas que votarem a favor desta deliberação estarão sujeitos a realizar uma oferta pública de aquisição de ações dos outros acionistas. Considerando os estatutos analisados, aproximadamente 53% das companhias adotam exclusivamente a penalidade tipo 1, e 47% adotam a penalidade tipo 1 juntamente com a tipo 2. Somente oito companhias apresentam cláusula expressa permitindo a remoção da pílula, sendo que 6 delas conferem essa autoridade aos acionistas e 2 ao conselho de administração.

Em suma, a única semelhança entre a poison pill brasileira e a americana é a existência de gatilho que delimita a porcentagem de aquisição de ações que dispara ambas as técnicas de defesa. A americana resulta em aumento de capital juntamente com direito de preferência distribuído a antigos acionistas e a brasileira em obrigação de compra das ações dos acionistas já existentes.

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*Professora da Cornell Law School nos Estados Unidos e da

Direito GV

 

 

 

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