Porandubas nº 553
quarta-feira, 8 de novembro de 2017
Atualizado em 7 de novembro de 2017 16:35
Abro a coluna com a Paraíba do grande José Américo.
Cancelando chuvas
A seca era medonha. A Paraíba em desespero, o governador aflito. Um dia, caiu uma chuva fininha no município de Monteiro. Inácio Feitosa, o prefeito, correu ao telégrafo: "Governador José Américo: chuvas torrenciais cobriram todo município de Monteiro. População exultante: Saudações, Feitosa". Os comerciantes da cidade, quando souberam do telegrama, ficaram desesperados. O município não ia mais receber ajuda. Ainda mais porque a mensagem era falsa e apressada. Feitosa correu de novo ao telégrafo: "Governador José Américo: cancelo chuvas. População continua aflita. Feitosa, prefeito".
O clima político
A tensão pode ter diminuído com o fechamento da porta da 2ª denúncia contra o presidente, mas o ambiente parlamentar ainda é cheio de interrogações. E de muita pressão. Dúvidas: o governo terá forças para levar adiante a agenda reformista? Conseguirá ter suficiente número de votos para aprovar a reforma da Previdência? E a simplificação tributária? A pressão está alta. Partidos do centro querem ver tucanos fora da base e tomar seu lugar. PMDB, inclusive, faz pressão. O presidente ouve muita gente no confessionário do Planalto.
PSDB, taquara rachada
O tom é, como se diz no vulgo, de taquara rachada. Meio agudo, meio grave. E muito sustenido. (Desculpem os musicólogos se este escriba cometeu heresia com a partitura). O fato é que o tucanato continua sem saber que rumo tomar. Parte quer sair logo do governo, parte quer ficar até abril, prazo de desincompatibilização de ministros que serão candidatos nas eleições de outubro. A impressão é de que a saída será antecipada. O desgaste para a imagem do governo com as trapalhadas do PSDB já foi contabilizada. O que mais está em jogo?
Imagens dos candidatos
O que está em jogo é a imagem de candidatos. Imaginam que permanecer na máquina faria um dano a suas imagens. Ora, os tucanos não vão melhorar sua imagem com saída antecipada. Já estão depreciados sob esse prisma. O guru do partido, FHC, quer ver logo a saída. Alckmin, idem. Mas essa posição não atenuará a posição dúbia do partido. O eleitorado sabe quem é quem. E acompanha até as maquinações de efeito eleitoreiro. É evidente que o partido manteve um cordão umbilical com o governo. Constatar que a protelação da saída ligaria o PSDB ao peemedebismo, como escreveu Fernando Henrique, é sandice. Execrar agora a aliança com o PMDB é burrice. Que santidade FHC está querendo apregoar?
As chances de Alckmin
Se Geraldo Alckmin acha que vai ganhar mais votos com o afastamento dos tucanos do governo Temer cometerá um desatino. A real politik, governador, se ancora em parcerias entre siglas. Se não por identificação ideológica - eis que todas nadam no pântano da desideologização -, pelo menos por conveniência. Afinal, os bons minutos que o PMDB e outras execradas siglas possuem serão vitais para a massificação do discurso de candidatos. O PMDB não vai deixar seus minutos migrarem com facilidade. Detalhemos essa questão.
Tempo de TV
O tempo de TV e rádio será fundamental na campanha de 2018. Mais que em campanhas anteriores. Por uma simples razão: a campanha será mais curta - 35 dias de mídia e não mais 45 -, recursos financeiros também bem mais curtos, eleitorado desconfiado e indignado, expectativa por um discurso convincente. Partamos de um exemplo: João Doria, em São Paulo, fez o maior leque de alianças partidárias dos últimos tempos. Teve um tempo longo de rádio e TV para expor suas propostas. Ganhou muita visibilidade. E deixou seu opositor para trás em matéria de articulação com as massas.
Articulação e mobilização
A campanha de 2018 vai se amparar, além do eixo da comunicação, nos eixos da articulação e da mobilização. O primeiro diz respeito aos contatos, parcerias e efetivos vínculos que os candidatos deverão estabelecer com entidades organizadas, líderes comunitários, bases políticas nas regiões e bairros, etc. Já a mobilização diz respeito aos contatos diretos com o povo. Se o candidato em campanhas passadas chegava a gastar sola ou borracha de dois pares de sapatos, deve se preparar para gastar quatro pares. Vai ter muita andança. O eleitor indignado vai querer ver o candidato - olho no olho, ombro a ombro, testa a testa, mão na mão, porta a porta, casa a casa.
Campanha mais direta
Candidatos não são sabonete ou pacote de macarrão. Não adianta fazer uma bela campanha de marketing televisivo, com a fosforescência de luzes e efeitos cinematográficos. O eleitor está desconfiado de tantas promessas. Quer sentir a alma do candidato. E não apenas sua voz pelo rádio ou TV. Quer conferir o grau de verdade. E isso será objeto da maior proximidade entre candidato e eleitor. Os valores pessoais serão checados. Mas o projeto, a ideia central, as propostas, enfim, deverão ganhar substância. Programas devem ser oportunos, diretos, objetivos, de forma a atender aos reclamos mais urgentes das populações, dos Estados e regiões.
Um bom candidato
Em 2018, o eleitor buscará um candidato com as seguintes qualidades: experiência, honestidade; vida limpa e passado decente; assepsia; equilíbrio/ponderação; preparo; coragem/determinação; autoridade (não confundir com autoritarismo). Há uma saturação de perfis antigos, que usam as esteiras da velha política. O eleitor quer ver perfis mais identificados com suas grandes demandas: segurança, saúde, educação, melhoria das condições de vida nas regiões, nos bairros, nas ruas. Quem apresentar propostas mais condizentes com as necessidades do eleitor terá melhores condições de ser escolhido.
E o medo? Lula e Bolsonaro passam
Lula e Bolsonaro aparecem hoje como finalistas das eleições de 2018. Este consultor político não acredita nesta hipótese que tem sido defendida por analistas de todos os espectros. Por quê? Primeiro, porque um deve ser impedido pela Justiça e o outro, porque, além de ser considerado um perigo radical, deverá ser engolfado pela avalanche de discursos de outros. Bolsonaro terá muito pouco tempo de mídia. Não resistirá. E Lula, mesmo que garanta sua condição de candidato, passa hoje mais medo do que esperança. Em 2002, expressava esperança. Hoje é a extensão do medo. Principalmente junto aos bolsões médios, que funcionam como os clarinetes e trompetes da orquestra.
Esperança
Essa é a virtude mais ansiada pelos conjuntos eleitorais. Das margens carentes aos grupamentos mais altos da pirâmide social. Os pobres esperam que seu candidato abra as portas da esperança, sob a ilusão de que ele trará progresso, encherá seu bolso de dinheiro, garantirá a educação de seus filhos, comida barata, transporte ligeiro. Enfim, a felicidade está atrás da porta que o candidato promete abrir. Já as classes médias querem ver políticas mais ajustadas ao estado do país e que se reflitam em segurança, harmonia social, melhoria dos serviços públicos, conforto. O candidato que mais se identificar com estas expectativas e políticas será escolhido no momento do voto. (É claro que haverá sempre bolsões tradicionais que votarão de "cabresto").
Segurança
O país está tomado pela violência, que se espraia por todo o território. Por isso, o discurso da segurança será bem acolhido. Mas as promessas vãs e banais - bandido bom é bandido morto, bandido irá para a cadeia - não conseguirão convencer. Propostas devem ser demonstradas quanto à viabilidade. O discurso exigirá comprovação sobre a aplicação das ideias. Onde estarão os recursos? De onde virão? Maná não cai do céu. Quem desejar ser crível, precisa comprovar aquilo que dirá.
Rio de Janeiro
O Rio de Janeiro é um caso sério. Garantir segurança no Rio de Janeiro parecerá tarefa para um semi-deus. Como? As Unidades de Polícia Pacificadora estão enfrentando problemas. No Rio, o furo é mais em cima. Conluio de corrupção. O ministro Torquato Jardim pôs o dedo na ferida.
Lula perdoa
Lula está dizendo que "perdoa" os golpistas. Pragmático, acena a aliança com Renan Calheiros, em Alagoas, e Eunício Oliveira, no Ceará. A Democracia Socialista (DS) reage. Combate essa formação. Gleisi, a presidente do PT, acena com parcerias de esquerda, o que faz fechando o olho direito, que reabre para ver Lula entrando de soslaio pela banda direita. Eita, PT.
A invasão chinesa
Os chineses iniciaram a invasão no Brasil. De janeiro a outubro deste ano, movimentaram cerca de US$ 10,84 bilhões - mais de R$ 35 bilhões. As aquisições chinesas saltaram de 6, no ano passado, para 17. E vão subir muito. Em 2018, espera-se uma enxurrada de recursos. Pelo menos 10 grandes empresas demonstram interesse em investir em áreas como energias renováveis, ferrovias, portos, mineração, papel e celulose e até em telecomunicações.
Reforma trabalhista
Sábado, 11, entrarão em vigor os dispositivos aprovados na reforma trabalhista. Parcela de juízes do trabalho e membros do Ministério Público do Trabalho prometem não cumprir a nova legislação. Seria um caso clássico de desobediência civil, que baterá inevitavelmente nos Tribunais Superiores. Só estes poderão sustar os "violadores" da lei. Só mesmo no Brasil pode-se constatar a aberração de um juiz - o servidor por excelência para fazer cumprir a lei - desobedecer o estatuto legal.
Neil Ferreira
Um nome que fez história na propaganda brasileira. Um dos mais criativos publicitários. Um contador de belas histórias. Um gozador. Um grande papo. Um crítico feroz da política e de seus protagonistas. Um amigo. Deu-nos adeus, ontem. Que Deus o acolha.
Fecho a coluna com uma historinha do Paraná.
Conversando no jardim
Manuel Ribas, interventor no Paraná (1932/1935), depois governador (1935/1937), despachava no palácio, mas gostava de morar em sua casa. Bem cedinho, chega um rapaz e encontra o jardineiro regando o jardim:
- Seu Ribas está? Sou filho de um grande amigo dele. Meu pai me mandou pedir um emprego a ele. Eu podia falar com ele?
- Poder, pode. Mas, e se ele não lhe arrumar o emprego?
- Bem, meu pai me disse que, se ele não arranjasse o emprego, eu mandasse ele à merda.
- Olhe, rapaz, passe às 4 da tarde lá no palácio, que é a hora das audiências, e você fala com ele.
Às 4 horas, o rapaz estava lá. Deu o nome, esperou, esperou. No salão comprido, sentado atrás da mesa, o jardineiro. Ou seja, o governador. O rapaz ficou branco de surpresa.
- O que é que você quer mesmo?
Repetiu a história. "Meu pai me mandou pedir um emprego ao senhor".
- E se eu não arranjar o emprego?
- Então, seu Ribas, fica valendo aquela nossa conversa de hoje de manhã, lá no jardim.